domingo, 31 de julho de 2011

Férias e "Potter às dúzias"


Como já devem ter reparado, está tudo de férias. Até vocês, que visitam o blog. Portanto estou aqui a escrever um bocado para o ar (brincadjeirinha, ainda andam por aí 60 ou 70 resistentes que não nos largam!), mas o que é que se há-de fazer, eu não ficaria feliz por deixar o blog praticamente às moscas durante uns dias sem dar qualquer tipo de explicação.

Apesar de ser óbvio, afinal estamos a entrar em Agosto, o mês de férias por excelência, em que o pessoal só quer é praia e coisas afins. Adiante. Estamos os 3 de férias. As duas meninas do blog já andam anti-net há uns tempos, e eu também vou apanhar disso, não tarda. Vou tentar, aliás, vamos tentar passar por aqui e escrever qualquer coisa, mas pelo menos na próxima semana e picos nenhum de nós promete nada.

No entanto temos uma pequena novidade bastante espectacular! Com a estreia do último filme do Harry Potter, *aviso: cliché!* chegamos ao fim de um ciclo. Um bendito ciclo que começou há uma catrafada de anos e que até temos medo de dar como terminada. Começaram os livros, começaram os filmes, acabaram os livros e agora acabaram os filmes. É uma pena, mas não podia durar para sempre. E portanto, para celebrar/despedir e encher o blog com tantos textos relacionados com esta saga que até vai enjoar, decidimos fazer uma pseudo-Temporada Temática, que eu intitulei (agora mesmo) de "Potter às dúzias".

É um conceito simples, este "Potter às dúzias": todos os 3 vamos ler a saga completa, de fio a pavio, seguidinha e sem interrupções! Ou seja, já ficam prometidas no mínimo 21 opiniões, 3 por livro. Assustador, não é? Ainda por cima sabendo que corremos o risco de assustar alguns dos nossos seguidores e potenciais visitantes, com tanto Potter, mas estamos confiantes que é uma saga que diz tanto a tanta gente, que a maior parte das pessoas que nos lêem nos compreendem perfeitamente e vão conseguir aguentar aquilo que esperamos não se arraste durante demasiado tempo.

Com isto dito, não sei exactamente quando começamos, nem vamos começar todos ao mesmo tempo, e não prometemos nenhum tipo de regularidade nos primeiros dias. Vamos lendo e vamos publicando. Comentem, dêem sugestões, refilem, critiquem, leiam, acompanhem-nos e enviem-nos textos sobre a saga, divirtam-se! Como é óbvio, não prometemos publicar tudo o que nos enviarem, até podemos nem publicar nada, mas estejam à vontade para tentarem.

Dito isto, só falta despedir-me, que estou a morrer de fome e já me está a cheirar a comida. Hasta la pasta mes amis!

sexta-feira, 29 de julho de 2011

A Verdade Está no Limite

Título:  A Verdade Está no Limite
Autor: Antonio J. Durán

Sinopse: É difícil subestimar a importância do cálculo infinitesimal e de conceitos como "derivada" e "integral", tendo-se mesmo chegado a afirmar que, sem eles, a revolução científica teria sido impossível. Embora a sua génese remonte à Antiguidade, o seu avanço definitivo ficou a dever-se ao trabalho simultâneo de dois gigantes do pensamento ocidental: Leibniz e Newton. A disputa que se estabeleceu entre ambos pela prioridade da descoberta abalou toda a Europa científica do século XVII.

Opinião: Mais uma capa em espanhol, peço desculpa, mas encontrar as capas destes livros em português é mais complicado do que parece. E claro, mais uma vez, a preguiça de tirar uma foto é demasiado grande. Mas também não morre ninguém.

Adiante. Estes livros são quase sempre interessantes, uns mais que outros, já se sabe, e este faz parte daqueles mesmo interessantes, apesar de o ser menos em termos matemáticos e mais em termos históricos. Até fofoqueiros. Este livro é quase a TV Guia da colecção, se a referida revista tivesse o mínimo de interesse, conteúdo de qualquer espécie, fosse extremamente culta e soubesse calcular o integral ou a derivada de uma função.

É que o tema central deste livro é a disputa (já se questionaram sobre a origem desta palavra? Eu tenho uma teoria, que envolve trocar o "s" por "z", meter um espaço a seguir, e imaginar que era isso que se dizia nas primeiras discussões, quando queriam discutir alguma coisa, e então a coisa juntou-se e pegou) entre Newton e Leibniz, dois verdadeiros génios do seu tempo, sobre a paternidade do cálculo infinitesimal.

O cálculo infinitesimal integra (passe a redundância matemática), duas operações, inversas uma da outra: a derivação e a integração. No fundo trata-se sempre de realizar cálculos utilizando infinitésimos, uma classe especial de números suficientemente próxima de zero para se poderem aproximar a zero, mas diferentes de zero de forma a poderem aparecer em denominadores de fracções. Ou seja, consideram-se zero sem serem de facto zero. Este cálculo é extremamente importante em áreas como a física, a geometria e a matemática e muitas outras ciências em geral.

A quezília deriva (estou mesmo engraçadinho, hoje), por um lado, do carácter tramado de Newton, excessivamente tímido, de tal forma que chegava a publicar as suas descobertas e o seu trabalho décadas depois de ter tudo finalizado; por outro do carácter arrogante de Leibniz. A realidade é que ambos contribuíram de forma importantíssima para o desenvolvimento desta matéria, Newton efectivamente descobrindo-o primeiro e Leibniz ao criar uma notação simples e brilhante, que ainda se usa hoje em dia.

É engraçado ver as discussões que se geraram em volta deste assunto, com ambos os intervenientes a insultarem-se mutuamente e a arrastarem discípulos e amigos para a discussão, fosse de forma intencional ou não. E para aqueles que tiverem mais medo da matemática, a grande hidra de 580 cabeças, fiquem descansados, que em termos matemáticos fala-se de muito pouco, neste livro. O essencial é mesmo a desavença entre dois dos maiores génios da época, quiçá de sempre, que apesar de tudo, tiveram várias contribuições importantes para a Ciência em geral.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Que as citações nos caiam em cima [13]

Uma citação mais curta, saída de boca de um homem que se prepara para matar outros dois, depois de uma das vítimas lhe perguntar se não era capaz de ter misericórdia pelo seu cocheiro, deixando-o viver, já que era ele, que falava, que tinha o dinheiro. Acho que é um choque interessante entre o desespero, a ignorância, a fé cega, a frieza e a inconsciência a que o ser humano se encontra constantemente sujeito.

"Se o deixarmos vivo será a primeira testemunha contra nós; custa o mesmo matar um ou matar dois. Para sete pecados basta uma penitência. Rezem a Deus, e pronto; basta de palavras!"

Anton Tchékhov, "A Estepe"

A Estepe

Título: A Estepe
Autor: Anton Tchékhov
Tradutor: Cordeiro de Brito

Sinopse: Considerada uma das mais belas narrativas de Tchékhov, A Estepe narra a viagem de um rapaz para uma cidade distante, onde irá estudar, acompanhado por um padre e um mercador. A despedida da sua casa, é também a despedida da sua infância. O romance foi publicado pela primeira vez em Março de 1888 na revista "Severnyi vestnik", representando a maturidade da sua ficção publicada numa revista literária e não num jornal como era habitual. O livro foi posteriormente considerado "o dicionário da poética de Tchékhov".

Opinião: Um pequeno livro, este quinto volume da colecção "Não Nobel". Escrito por Anton Tchékhov, um dos grandes vultos da literatura russa, conhecido especialmente pelos seus contos e textos dramáticos, deixou-nos esta obra que aparenta não ser nada de especial, mas que contém uma série particularidades e de temas passíveis de escapar a olhares mais desatentos.

A história em si, em termos narrativos, não é nada de muito extravagante. Iegoruchka é um jovem rapaz que parte com o tio, Ivan Ivanovytch, com o padre Cristovão e com Deniska, com o intuito de atravessar a gélida estepe russa e assim ter a oportunidade de prosseguir estudos, para se tornar alguém. Pelo caminho, os seus companheiros têm necessidade de fazer um desvio, para fazerem negócio, e deixam Iegoruchka entregue a uma caravana de infelizes carroceiros, junto dos quais enfrenta uma tremenda tempestade, que o deixa doente, e após a qual chega finalmente ao seu destino, ficando entregue a uma amiga da sua mãe.

Aquilo que é de facto relevante no meio disto tudo, para além da visão inocente que Iegoruchka tem daquilo que o rodeia, é que a travessia da estepe acaba por se tornar, como vem referido na sinopse, um autêntico ritual de passagem para o jovem russo, que de forma absolutamente inconsciente e gradual se vai apercebendo de como a vida é e de como é que as coisas realmente se processam. A sua inocência, que se vai perdendo, no fim de contas, permite a Tchékhov retratar na perfeição as condições das classes russas mais pobres, como terem que atravessar uma extensão gélida e mortificante como a estepe russa, completamente descalços, enfrentando tempestades e sabe-se lá mais o quê.

Mas o que eu achei mais fascinante foi a descrição sorrateiramente personificante que o escritor faz da estepe ao longo do livro, dando-lhe vida e deixando-me sempre à espera que ela simplesmente falasse com as outras personagens. Foi um trabalho verdadeiramente bem feito, esta caracterização da estepe enquanto personagem omnipresente, à qual todas as outras personagens parecem ser inconscientes. Chegam até a haver alguns deliciosos momentos de empatia entre a estepe e as personagens, especialmente Iegoruchka, um fenómeno que não consigo descrever, que deixa apenas uma breve impressão, depois de se acabar de ler as passagens em que isso acontece, e que apenas me deixa a opção de vos aconselhar a ler o livro, que apesar de não me ter deixado de forma alguma assombrado com aquilo que oferece, já valeu a pena, graças à personagem principal desta pequena novela: a estepe.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Que as citações nos caiam em cima [12]

Uma reflexão brilhante e intemporal, que devia ser tatuada na testa de todos os políticos.

"Observareis que a minha lealdade dizia respeito à Pátria, não às suas instituições nem aos que exerciam o mandato. A Pátria é o verdadeiro, o substancial, o eterno; o que se considera e defende e ao que uma pessoa deve render preito; as instituições são extrínsecas, simples vestuário, e o vestuário gasta-se, rompe-se, deixa de ser cómodo, deixa de proteger o corpo das inclemências do Inverno, das doenças e da morte. Ser leal aos trapos, dar vivas aos trapos, gritar pelos trapos, idolatrar trapos: morrer por trapos, é lealdade absurda, pura animalidade; pertence à monarquia, é inventado pela monarquia; que a monarquia fique com isso."

Mark Twain, "Um Americano na Corte do Rei Artur"

terça-feira, 26 de julho de 2011

Um Americano na Corte do Rei Artur

Título: Um Americano na Corte do Rei Artur
Autor: Mark Twain
Tradutor: Nascimento Rodrigues

Sinopse: Revólveres, canhões ou motores, não há nada que escape a Hank Morgan, o chefe de uma fábrica de armas em Hartford Connecticut. Mas uma luta com um dos trabalhadores põe Morgan inconsciente e fá-lo recuar até... ao século VI. Em Inglaterra, no meio do mítico reino de Camelot, com rei Artur, Lancelot e Guinevere. Com inúmeras adaptações no cinema, Um Americano na Corte do Rei Artur encanta tanto as crianças como os adultos.

Opinião: O azul da capa deste livro é espantabuloso! É que nem vos passa pela cabeça, é absolutamente hipnotizante, estupidamente apelativo e perfeitamente azul. Fiquei tão fascinando que tratei logo de tornar este livro no "próximo a ler" o mais rapidamente possível. E cá está.

Ainda por cima até custava a acreditar que eu ainda não tivesse lido nada deste tão famoso escritor, especialmente se se tiver em conta que tenho ali uns 2 ou 3 livros da sua autoria. Pois bem, esta verdadeira comédia pareceu-me ser o livro ideal para me iniciar na leitura da sua obra, aproveitando o facto de ter saído na colecção "Não Nobel", pois de outra forma acho que nunca iria saber que este livro existia (só conheço um filme, e não tem NADA a ver) e muito menos que foi escrito por Mark Twain!

E apesar de ter as expectativas presas naquele limbo entre "altas" e "o que raio é que vai sair daqui?", por tanto ouvir falar do autor, apesar não lhe ter lido nenhuma obra, fiquei satisfeito. Tremendamente satisfeito.

"Camelot... Camelot - pensei. - Não me lembro de já ter ouvido esse nome. Será o do manicómio, possivelmente."

É assim que verdadeiramente se inicia a história, depois de um começo curioso em que o autor se descreve a si mesmo a dar de caras com um homem desconhecido de modos um pouco estranhos, que acaba por lhe falar da história narrada ao longo do livro, mostrando-lhe o diário novelizado que escreveu enquanto esteve "prisioneiro" de uma época passada, ao serviço do Rei Artur (esse mesmo, o das lendas). A partir daí, e começando com aquele excerto que transcrevi acima, lemos esse mesmo diário, acompanhando as aventuras da Hank Morgan na Inglaterra do século VI.

O tom do relato é essencialmente cómico, apesar de o fazer sempre com uma cara séria, se é que me faço entender. Descrevem-se as maiores barbaridades e parvoíces, sempre com uma linguagem impecável e imperturbável, o que dá toda uma nova dimensão cómica a tudo o que se passa, desde os cavaleiros convertidos em vendedores de sabonetes, às equipas de basebol constituídas apenas por soberanos dos vários reinos existentes naquela época...

Tudo aquilo que o livro tem de cómico deriva da transposição da tecnologia e do conhecimento do século XIX, do ridículo dos comportamentos das personagens da época e da sua ingenuidade. Estes três elementos permitem que Hank, através de uma série de truques, tornar-se a segunda pessoa mais importante do reino, suplantando o próprio Merlin, que neste livro não passa do pior tipo de charlatão: aquele que não acredita que o é.

De notar especialmente o humor e a classe com que esse humor chega até ao leitor. É preciso, no entanto, ter em atenção que os mais variados tipos de humor, todos bem misturados, no início, comecem a dar lugar a um tom muito mais ácido e corrosivo, de autêntica crítica já pouco disfarçada, dando lugar a apenas alguns escassos gracejos aqui e ali.

É um livro fascinante, tal como a capa desta edição. Acho muito bem que o leiam e fiquem maravilhados por vocês mesmos, com uma obra capaz de fazer soltar gargalhadas na mesma medida em que faz pensar. O que, aliás, se lerem, vão ver que só confirma aquilo em que cada vez mais acredito: é o humor que permite uma melhor visão do mundo como ele realmente é.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

A Certeza Absoluta e Outras Ficções

Título: A Certeza Absoluta e Outras Ficções
Autor: Pere Grima
Tradutor: João Pedro Piroto Pereira Duarte

Sinopse: A estatística é normalmente descrita como a prática de "torturar os dados até estes confessarem". Tanta desconfiança talvez se deva ao facto de a estatística partir da convicção de que "certo" pouco mais significa do que "altamente provável". Contudo, é sem dúvida o ramo mais importante da matemática aplicada, e constitui o nosso melhor guia para tomar decisões correctas quando enfrentamos a incerteza - isto é, quase sempre.

Opinião: Eu sei que a capa está em castelhano. E sei que a qualidade está má. Mas não se encontra a capa da versão em português, e não me apeteceu tirar foto, já que a preguiça é muita! Enfim, também não é importante.

O importante é falar sobre este ramo da matemática, a estatística, a que eu tão carinhosamente chamo "a ovelha negra da ciência mais exacta de todas". E acho que até já falei disto algures, vá-se lá saber porquê: imaginem que estão duas pessoas numa sala, e que todos os dias se leva um frango para essa sala. Uma das pessoas come-o todo, logo, a outra não come nada. Estatisticamente falando, em média ambos comem meio frango, mas na realidade uma passa fome e a outra enche o bandulho! E há mais, é um autêntico festim!

No entanto, confesso, depois de ler o livro olho para a estatística com outros olhos. Para começar tem umas fórmulas bem lixadas (metem sempre medo e inspiram respeito, mesmo que não sirvam para nada ficamos a pensar "ui, que coisa difícil" e pronto, enfim), e depois o autor explica muitíssimo bem como é que tudo funciona, como é que tudo se faz como deve ser e isso tudo. Dá montes de exemplos, alguns um bocado estrambólicos, como "os mortos por coices de cavalo no exército prussiano", e uns mais mundanos e simpáticos, como "os golos da primeira liga de futebol". Já agora, ambos os exemplos seguem a distribuição de Poisson, que significa peixe, embora não tenha nada a ver, era o nome do senhor, e contudo, mais à frente, aparecem peixes, apesar de, lá está, não ter nada a ver.

E o facto mais curioso? Algo que não tem absolutamente nada a ver coma estatística: a Lei de Stigler dos Epónimos, que diz, de forma bastante simplificada, segundo as palavras que vêm no livro "nenhuma descoberta científica tem o nome de quem realmente a fez". Isto é absolutamente genial! Vou citar alguns exemplos que aqui aparecem: a doença de Alzheimer foi relatada por meia dúzia de médicos antes de Alois Alzheimer; a famosa constante de Euler, e = 2,718281828..., foi descoberta por Jacob Bernoulli; o último teorema de Fermat foi apenas conjecturado por Fermat, já que o teorema foi demonstrado por Andrew Wiles em 1995; até o cometa Halley já era conhecido dos Antigos, muito antes de Edmond Halley; e a distribuição normal, ou sino de Gauss, foi descrita pela primeira vez pelo matemático francês Abraham de Moivre, quase 80 anos antes de Gauss. Fascinante, hã?

Resumindo, vejo a estatística com novos olhos. Não é propriamente um ramo obscuro, é apenas o mais facilmente manipulável, porque depende do ponto de vista, das comparações que se fazem e de uma miríade de factores intermináveis... Concluo ainda que foi dos livros desta colecção que mais prazer me deu ler, apesar de ser exactamente sobre um tema que não me agrada por aí além, e que não me inspirava muita confiança, ou seja, definitivamente aconselhado a TODA a gente!

terça-feira, 19 de julho de 2011

Judas, o Obscuro

Título: Judas, o Obscuro
Autor: Thomas Hardy
Tradutor: Maria Franco e Cabral do Nascimento

Sinopse: "Judas, o Obscuro" narra o drama do pedreiro Judas Fawley, cujas ambições estão amarradas pela condição social. Depois de um casamento tumultuoso, Judas ruma a Christminster com o intuito de mudar a sua vida e apaixona-se pela delicada e intelectual Sue Bridehead que em nada se parece com a sua primeira mulher Arabella. Ambos protagonizam uma história de amor repleta de tragédia no panorama histórico-social de uma Inglaterra do século XVIII.

Opinião: O terceiro livro da excelente colecção "Não Nobel" é um clássico relativamente típico, se é que isso existe. Vamos lá ver se me consigo explicar: por um lado não apresenta nenhum elemento fora do comum, nem nenhum mistério nem nada desse tipo ou semelhante. Aquilo que é retratado neste livro é pura e simplesmente a vida de Judas Fawley, sábio por realizar, teólogo falhado e pedreiro de profissão.

No entanto não é propriamente a história tradicional, em que o protagonista vai conseguindo realizar objectivos e cumprir os mais variados desígnios, num caminho mais ou menos tortuoso para o sucesso ou para algum tipo de realização pessoal. Nem mesmo no que toca a encontrar o amor da sua vida. Pelo menos no que toca a ficar com essa pessoa. A história de Judas Fawley é muito mais obscura que isso, um caminho mais do que tortuoso, repleto dos mais variados obstáculos, numa sucessão de objectivos falhados e desígnios por cumprir, que destroem o seu optimismo a pouco e pouco, dando lugar a um pessimismo e um fatalismo quase irracional, ainda que bastante compreensível.

Aquilo que mais gostei neste livro foi mesmo a personagem principal, Judas, especialmente no princípio, quando quase que me conseguia identificar com ele, com a sua sede insaciável de saber e a sua determinação de ferro para lutar contra tudo e todos de forma a conseguir atingir o objectivo a que se propôs, de ir para Christminster e seguir uma carreira como universitário. Mas depois, quando isso caiu por terra por causa de uma mulher (ainda por cima aldrabona), Judas começou lentamente a ficar desesperado, praticamente a arrastar-se, cada vez mais, ao longo da história, numa agonia crescente que parece nunca mais ter fim.

E comecei a desgostar mais dele por causa das suas sucessivas desistências, por este ou aquele motivo, pelas cedências que fez aos ideais de outrem e às concessões que fez às normas da sociedade em geral. Mas quer dizer, eu não vivo naquela época, e não sofri nem uma décima parte das desgraças sucessivas que aquela personagem sofreu, nem nada que se pareça, portanto não posso falar muito, mas digamos que gostaria mais Judas tivesse revelado um bocadinho mais de espinha e tivesse lutado afincadamente contra as adversidades, fossem quais e quantas fossem.

Quanto à parte que menos gostei, foram mesmo as personagens femininas. Eu não sei qual era o problema deste autor com as mulheres, mas as personagens femininas ou eram velhotas meio malucas ou eram raparigas jovens extremamente inconstantes. Bem, talvez fossem mulheres normais (desculpem, não resisti), mas a verdade é que no que toca às raparigas inconstantes, só têm um aspecto que me agradou, a aversão à religiosidade, uma por ser relativamente ignorante e a outra por ser relativamente inteligente Mas tirando isso, por amor do deus que vocês quiserem, ora querem casar, ora não querem casar. Ora se divorciam, ora voltam a casar. Ora são pagãs fervorosas, ora são católicas beatíssimas. No espaço de duas páginas, que é como quem diz meia hora de tempo de história, chegam a mudar de ideias e de discurso 4 e 5 vezes!

Mas enfim, tirando essa parte, não me posso queixar, é um livro excelentemente bem escrito, ainda que com uma tradução pouco cuidada, mas enfim, foram só 6 euros, e independentemente disso, a história é óptima e reveladora daquilo que é mais básico e mais natural na condição humana, a nossa tendência para o pessimismo e para o fatalismo, e a nossa quase necessidade de acreditar em forças superiores que nos guiem, para que nos possamos recostar e deixar entregues nas suas mãos, desculpabilizando-nos dos nossos erros.

domingo, 17 de julho de 2011

Que as citações nos caiam em cima [11]

E neste excerto temos Thomas Hardy, no seu melhor, a falar do amor na condição humana, assim, do nada. As palavras são ditas pela boca de Sue Bridehead, prima e algo mais do Judas Fawley, o Obscuro do título.

"- À parte o nosso caso especial, é estranho para a natureza de um homem ter de amar uma pessoa quando lhe digam que deve fazê-lo. Seria mais plausível que ele o fizesse se lhe dissessem que não amasse... Se a cerimónia do casamento consistisse numa promessa e num contrato assinado entre as partes para deixarem de se amar desde essa hora em diante e evitar cada um a companhia do outro (quanto possível em público) haveria muito mais casais enamorados do que há presentemente. Imagina as entrevistas secretas entre o marido perjuro e a esposa, o receio de serem vistos juntos, as entradas furtivas pela janela do quarto, as ocultações nos armários... Haveria menos frieza, acredita."

Thomas Hardy, "Judas, o Obscuro"

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Harry Potter e os Talismãs da Morte (Parte 2)



E é com este lançamento histórico que acaba a saga de filmes de Harry Potter.

A história que desde cedo me é muito querida, vê por fim findada a sua versão cinematográfica.

As minhas expectativas, ligeiramente rebaixadas pelos últimos filmes, dividiam-se entre o muito altas e o tristemente baixas. De qualquer forma, e como boa fã da saga de J. K. Rowling, não podia perder a estreia de 14 de Fevereiro (um dia antes do que veio a estrear no Reino Unido).

E eis que David Yates não só subiu milhares de pontos na minha consideração, como também me proporcionou uma das experiências cinematográficas mais intensas de sempre.

Sim, adorei Harry Potter e os Talismãs da Morte Parte II. Sem dúvida o melhor filme da saga, extremamente bem realizado, numa adaptação perfeita do grande final ao grande ecrã. É certo que a história foi encurtada, algumas cenas ligeiramente alteradas, mas afinal, cinema não é literatura.

Neste último (grande) filme, conhecemos uma maior intensidade emocional e nostálgica, algo perdida nos últimos filmes, contrabalançada com uma boa dose de acção e suspense, alguns mistérios revelados, outros deixados em aberto, e uma cena final de levar às lágrimas e a pedir mais. Porque afinal, dizemos adeus a um rapaz desajeitado, estranho e incompreendido, nada mais que a alegoria de um adolescente comum, que cresceu connosco.

E é já com saudades que aconselho que se adoras Harry Potter vai já a correr ver o filme, se não gostas, apressa-te ainda mais.

domingo, 10 de julho de 2011

Biblioteca de Verão


Começa hoje uma colecção de livros com o Jornal de Notícias/Diário de Notícias, chamada "Biblioteca de Verão", à semelhança da iniciativa levada a cabo o ano passado. Foi com algum medo que trouxe o primeiro volume para casa, receoso que estes livros tivessem a qualidade dos livros do ano passado (que era bastante rasca, já agora, a qualidade, que os livros eram bons). Mas nada disso nem nada que se pareça!

São livrinhos pequeninos, quer em grossura quer em tamanho geral, que cabem facilmente numa mala de senhora ou até nos bolsos! Eu pelo menos tenho algumas calças com bolsos para isto. A qualidade da edição é bem boa, com capas fisicamente melhores que a colecção "Não Nobel", do Público, e apesar de esteticamente preferir as capas dos rejeitados pela Academia Sueca, devo dizer que esta colecção também não está nada mal.

E depois a grande surpresa. São todos livros de contos e de montes, carradas, resmas de autores super-hiper-mega-ri-conhecidos! Só neste primeiro volume temos: Oscar Wilde; Guy de Maupassant; Anton Tchekhov; Rainer Maria Rilke e Aldous Huxley! Já li coisas do primeiro e do último, tenho curiosidade quanto ao segundo e ao terceiro, e acho que nunca ouvi falar do quarto, mas afirmo-me já rendido.

E mais! Nos próximos volumes, só para citar alguns, iremos ter direito a: Alexandre Dumas; Honoré de Balzac; Edgar Allan Poe; Selma Lagerloff; Rudyard Kipling; George R. R. Martin; H. G. Wells; Robert Louis Stevenson; Virgina Woolf; Eça de Queirós; Machado de Assis; D.H Lawrence; James Joyce; William Faulkner e Dostoievsky, entre tantos outros!

Acho que é, sem dúvida absolutamente nenhuma, uma colecção a não perder!

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Wolf Hall

Título: Wolf Hall
Autor: Hilary Mantel
Tradutor: Beatriz Sequeira

Sinopse: Henrique VIII está no trono, mas não tem herdeiros. O cardeal Wolsey é o conselheiro do rei encarregue de obter o divórcio que o papa recusa conceder. Neste ambiente de desconfiança e necessidade aparece Thomas Cromwell, primeiro como secretário de Wolsey, e depois como seu sucessor. Cromwell é um homem muito original: filho de um ferreiro bruto, é um génio da política, um subornador, um galanteador, um arrivista, um homem com uma habilidade incrível para manipular pessoas e aproveitar ocasiões. Implacável na procura dos seus próprios interesses, Cromwell é tão ambicioso nos seus objectivos políticos como nos seus objectivos pessoais. O seu plano de reformas é implementado perante um parlamento que apenas zela pelos seus interesses e um rei que flutua entre paixões românticas e fúrias brutais

Opinião: Wolf Hall é a história de um homem ambicioso, que subiu a pulso desde filho do ferreiro de uma localidade remota, até se tornar no segundo homem mais importante de Inglaterra, atrás apenas do próprio Rei, o (nem sei bem como o descrever...) volátil Henry VIII, segundo Rei da dinastia dos Tudor. Esse homem é Thomas Cromwell, normalmente retratado como um homem  malicioso e sem escrúpulos, matreiro que nem uma raposa e absolutamente imperturbável, de uma forma bastante insensível a tudo o que o rodeia. Podem ver estes retratos em pelo menos dois sítios, que são os que eu conheço bem e que já referi numa publicação anterior: a série de televisão Os Tudor (que recomendo) e o livro de Philippa Gregory, Catarina de Aragão - A Princesa Determinada (que também recomendo).

O mais fascinante neste livro é que ele demonstra como Cromwell era de facto tudo isso. Ou pelo menos aparentava. É difícil de explicar. Ao contar a história do costume, que já toda a gente conhece, do divórcio de Henry VIII da sua primeira mulher, Catarina de Aragão, para se casar com Anne Boleyn, só que do ponto de vista de Cromwell, a autora dá uma visão que não é propriamente mais humana, mas diferente, uma vez que o Cromwell profissional é exactamente o mesmo que o Cromwell pessoal.

Mas bem, para não me alongar demasiado, deixem-me já partir para a escrita, que é um tanto ou quanto confusa, por vezes. Para começar, uma insistência pouco usual em pronomes, dizendo mais vezes "ele" do que Cromwell, por exemplo. Eu sei que pode não parecer nada de especial, mas acreditem em mim, torna-se bastante confuso. A juntar a isto há ainda um traço peculiar no que toca a diálogos e pensamentos, muitas vezes escritos de forma corrida, sem qualquer tipo de distinção do resto do texto (um bocado ao estilo de Saramago). Torna-se complicado porque como a autora oscila entre as duas opções, ora distingue, ora não distingue, nunca sabia muito bem se o que estava a ler era diálogo, se era um pensamento de alguma personagem ou se era simplesmente parte da narração.

Nada muito preocupante, no entanto. É uma óptima leitura, que apesar de ser enorme até passa rapidamente, se quem lê estiver empolgado (acho complicado é que não se fique, com um livro destes!). Eu pessoalmente fiquei absolutamente preso às suas páginas e, além daquele pormenor da escrita, só acabei a leitura com uma grande desilusão, o título. Wolf Hall é sonante, certo, e é alusivo ao "Homo hominis lupus" (O Homem é lobo para o Homem, em tradução demasiado livre), que praticamente guia Cromwell, sendo uma constante lembrança da natureza insidiosa e maliciosa do Homem, da qual o próprio Cromwell se aproveita, mas não me convence. Nenhuma parte da acção se passa em Wolf Hall, este é apenas referenciado meia dúzia de vezes (nem tanto!) e enfim, acho que o livro ficava melhor servido com outro tipo de título, mais directamente alusivo a Cromwell. Mas pronto, são escolhas, não deixem de ler que vale a pena, garanto-vos!

sábado, 2 de julho de 2011

A Mãe


Título: A Mãe
Autor: Máximo Gorki

Sinopse: Este romance é um retrato dramático e fascinante da luta revolucionária vista através da óptica familiar e do mundo dos trabalhadores. Baseado em fatos reais ocorridos nas fábricas de Sormovo, na Rússia czarista, onde Gorki conheceu o operário Zamolov (Paulo Vlassov no livro), militante revolucionário, e a sua mãe, Anna (Pelágia Nilovna no livro, que se dispõe à arriscada tarefa de distribuição de panfletos), protagonistas das manifestações do 1º de Maio de 1902, nessa mesma cidade, e da consequente prisão e julgamento dos envolvidos. Profundo conhecedor da cultura, dos falares, das gírias, dos costumes, das crenças e descrenças do povo russo, possibilitou a Gorki escrever obras clássicas da literatura mundial.

Opinião: Começarei esta minha apaixonada crítica pelo único ponto fraco facilmente substituível: a tradução. Tão má que por vezes me achei mais capaz de traduzir o russo de Gorki que o próprio tradutor.

A primeira objecção que se me levanta é a tradução dos nomes e a segunda, a aparente falta de cultura do tradutor, ao não conhecer o hino da Internacional Comunista (entre outras palavras de ordem comuns) e por conseguinte traduzi-los à letra, o que os despromove de toda a coerência.

Empurrando à parte este infeliz incidente, deitar-me-ei ao que me propus de início: opinar apaixonadamente.

Está, portanto, encerrada nesta obra, nada mais nada menos do que toda a essência da alma revolucionária: não a revolta massiva contra a injustiça, mas o esclarecimento pessoal e intelectual à escala mais pura e universal.

A Mãe é o que mais de poético há no socialismo. É a poesia de um ideal, o hino genuíno dos oprimidos comprimido nas palavras simples mas abrangentes de Gorki. A Mãe, Pelágia Vlassov, mulher de extrema benevolência e ingenuinidade, esmagada por um passado sofrido pelas constantes agressões do marido, vê no filho, Paulo, a encarnação da esperança, quando este lhe expõe com uma paixão ardente os seus ideais revolucionários.

Pelágia é a alegoria do povo explorado e ignorante, que lentamente vai reconhecendo a verdade do mundo.

Talvez a personagem mais modelada que tive a oportunidade de conhecer, a mãe, encanta-nos pela simplicidade e beleza com que absorve a luz do esclarecimento.

Sentimos, ao longo da narrativa, que esta se vai abrindo gradualmente, à medida que também os olhos de Pelágia se abrem para a verdade negra do mundo e da sua condição.

Uma obra cujo conteúdo é quente e reconfortante a qualquer utópico da liberdade, uma voz incomparável esta de Máximo Gorki, que se ergue contra o medo, inspirando.

De pé, ó vitimas da fome. Esta obra é Vossa.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Sobre nada em especial


Decidi aproveitar esta minha pausa entre exames para vir aqui discorrer um bocadinho. Tive (assim como a Marina e milhares de outros estudantes) exame de Português na Sexta passada e de Matemática nesta Segunda que passou. E pelo menos no que a mim me toca, só tenho exame no final deste mês, o que me deixou esta semana livre para ficar (na preguiça) a descansar.

Mas não se assustem! Não vim aqui falar mal dos exames, nem bem. Não me vim queixar e muito menos vangloriar do que quer que seja. Uns já passaram, outro está para vir, mas uma vez que hoje não é nem passado nem futuro (tão filosóficos que estamos hoje...), façamos de conta que não tenho esse peso sobre os ombros e falemos de coisas mais interessantes.

No entanto, desenganem-se, não sei bem do que vim aqui falar. Sei que não é dos exames (embora ainda não me tenha calado com isso, qual Caeiro e a sua metafísica), mas não tenho nada de especial para dizer. A realidade é que tenho várias pequenas coisas para mencionar, ligeiramente desconexas, talvez, mas enfim.

Primeiro que tudo, ando cá com uma vontade de comprar/roubar/ter/possuir/arranjar/ler livros antigos, como aqueles da imagem, de capa dura, com entalhes a dourado, páginas grosseiras e tudo o resto. É em alturas como estas que olho para a minha colecção do Júlio Verne e tenho vontade de os pôr na banheira para neles tomar banho, à là Tio Patinhas. É também nestas alturas que me lembro d'Os Lusíadas da Marina e começo a salivar. Parece-me que uma das primeiras coisas que vou fazer assim que acabar de vez com os exames (ou seja, em Agosto), vou visitar alfarrabistas DÊ POR ONDE DER!

Quanto ao livro que estou a ler, o (já por mim considerado) fantástico Wolf Hall, que me foi oferecido (bela prenda, tanto o livro, como quem mo ofereceu), só tenho a dizer que estou completamente embrenhado. Eu já conhecia história dos Tudor, pelo menos em traços gerais, graças à série televisiva Os Tudor, e ao livro de Philippa Gregory, Catarina de Aragão - A Princesa Determinada, mas esta visão do ponto de vista de Thomas Cromwell... É absolutamente deliciosa. Darei mais detalhes na opinião do livro, daqui a uns dias.

E pronto, mudemos bruscamente de assunto, só para referenciar os 150 seguidores que já temos no blog! É a loucura! Eu pessoalmente nunca pensei que chegássemos a este ponto, isto ultrapassa as minhas expectativas de quando eu e a Alice criámos o blog. Mas pelos vistos as coisas têm corrido bem, o que não me podia deixar mais feliz!

Termino com uma pergunta: conhecem algum livro cujo título contenha o nome de algum escritor? Cá por casa encontrei O Carteiro de Pablo Neruda, de Antonio Skármeta; O Ano da Morte de Ricardo Reis, de José Saramago; e A Mão Esquerda de Cervantes, de José Jorge Letria. A minha dúvida é se alguém conhece mais algum. Digam-me, se for o caso, é para um certo e determinado projecto... Tentem lá adivinhar.

Mas entretanto lembrem-se de mais livros que me possam ser úteis. Merci very muito!!