quarta-feira, 25 de junho de 2014

Defenders


Autor: Will McIntosh



Opinião: É fácil dizer que a linha entre o certo e o errado é ténue. Já não é tão fácil dizer que ela simplesmente não existe. Will McIntosh ainda consegue fazer algo melhor: usa este conto, Defenders, para o mostrar.

A partir de uma reciclagem interessante de uma premissa bastante usada - a da invasão alienígena - McIntosh cria uma raça de ciborgues gigantes, os Defenders, criados por nós para combater os invasores, Luyten, estranhamente parecidos com estrelas do mar gigantescas.

Mas o que fazer quando a guerra acaba? O que fazer a alguns milhões de robôs semi-orgânicos com inteligência artificial avançada depois de terem derrotado os inimigos? A resposta é ao mesmo tempo assustadora e divertida: dar-lhes a Austrália, privacidade e eterna gratidão.

Só quase trinta anos depois destes eventos é que um grupo de embaixadores humanos é convidado para visitar a sociedade que os Defenders construíram para si. O que encontram é uma Austrália de aspecto normal, mas gigante, Luyten escravizados e Defenders loucos.

O que aconteceu foi o que um dos Luytens diz a certa altura: a humanidade criou os Defenders demasiado depressa. Deixou-os incompletos. Incapazes de lidar com a sua própria senciência, os Defenders querem tomar conta do resto do planeta, para expandirem a sua civilização instável e acabarem por controlar os humanos da mesma forma que controlam os Luyten.

Esta opção é apresentada como uma proposta irrecusável, não uma que poderá acontecer, mas uma que irá acontecer.

Os Defenders estão muito bem caracterizados como poderosos, implacáveis e extraordinariamente loucos. Psicopatas autênticos. Há uma demonstração bastante clara desse aspecto logo no primeiro contacto entre embaixados e Defenders: quando uma surpresa preparada se revela desagradável, o Defender anfitrião rapidamente pede desculpa e assegura que o responsável por aquele ideia vai ser encontrado e morto. Assim, a seco, sem qualquer entoação nem demonstração de sentimentos em particular.

As atrocidades sucedem-se, vistas através dos olhos de Lila, a embaixadora da New Australia e testemunha directa da invasão Luyten e uma boa personagem, ideal para espelhar os diferentes pontos de vista em jogo nesta história.

A partir de certa altura a única opção que sobra aos humanos é uma aliança com os Luyten para exterminarem os Defenders. E é aqui que entra a moralidade da coisa: tendo em conta a história até aqui, seria de imaginar que os Luyten não sejam realmente os maus de fita, que talvez tenham sido obrigados a atacar por uma razão qualquer perfeitamente válida e que os verdadeiros vilões são os Defenders... Mas isso era demasiado fácil, não era?

Os Luyten são e serão sempre os vilões, invadiram a Terra por motivos egoístas e que dificilmente iremos compreender. Mas também são, em certa medida, os salvadores da Humanidade. Os Defenders, por outro lado, foram de facto os defensores que salvaram a espécie humana da destruição e subjugação. Não deixam, ainda assim, de ser os psicopatas com intenções de nos escravizarem.

Complicado. Muito complicado. E brilhantemente escrito por McIntosh, que consegue condensar estas dicotomias herói/vilão numa pequena mas intensa história, que é também um excelente conto de redenção, perdão e, acima de tudo, memória.

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