sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Os Vingadores #1


Título: Os Vingadores #1
Argumento: Jonathan Hickman
Ilustrações: Jerome Opeña

Opinião: Quando vi no Leituras de BD que a Marvel e a Panini iam lançar estas revistas por cá, a preços acessíveis, delirei! Ainda por cima são as linhas narrativas mais recentes, com sensivelmente um ano de atraso em relação aos Estados Unidos, o que é relativamente pouco.

A primeira conta com os Vingadores, e tem esta gloriosa capa (e contracapa e extra), que quer se goste ou não do estilo, chama a atenção!

Estava bastante curioso para ver como andavam este super-heróis, depois de mais uma crise e um reset ao seu universo. Não fiquei decepcionado. A revista é interessante e parece-me que faz na perfeição aquilo que é suposto: atrair novos leitores.

Sem esquecer os fãs mais antigos, a história junta os heróis do costume com mais-ou-menos-vilões novos, num cenário após o reset da última linha narrativa terminada, dando início a Marvel NOW!.

Estes vilões novos, Ex Nihilo, Abismo e Aleph, são intrigantes, especialmente Ex Nihilo, o criador de vida que quer transformar a Terra num novo paraíso, a partir de Marte. É claro que os Vingadores não ficam muito felizes com isso e tratam de o parar. Esta história é intercalada com o novo dilema do grupo: precisam de mais membros.

Assim, acompanhamos também o Capitão América e o Homem de Ferro a debaterem isso mesmo e a prepararem-se para iniciar uma campanha de recruta de novos Vingadores para a equipa.

A estrutura acaba por ser um pouco confusa, e a arte é "demasiado séria" para o tom humorístico a que os filmes me habituaram. Eu sei, eu sei, são coisas diferentes, mas as expectativas são uma coisa lixada.

De resto estou moderadamente excitado para ler as outras revistas, e tenho a certeza absoluta de que vou pelo menos acompanhar um dos títulos e comprar de certeza alguns dos números especiais (Guardians of the Galaxy? Marvel + space opera? CLARO QUE QUERO). Pela amostra, estou bastante satisfeito.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Que as citações nos caiam em cima [46]


"Um livro serve para nos protegermos do mundo."


A Espera
Rui Zink

A Espera


Título: A Espera
Autor: Rui Zink

Opinião: As minhas expectativas para este conto não era muito elevadas. A ideia que tenho de Rui Zink é a de um pseudo-intelectual com a mania que tem piada. É a imagem que tenho do pouco que sei do homem, e acredito que não corresponda de todo à verdade, mas já lhe li algumas crónicas e nunca vi nada de interesse.

Felizmente A Espera conseguiu surpreender-me. As personagens são cativantes e, no caso de Tom, seriamente enigmáticas. A estrutura é curioso, com vários momentos intercalados, contando em paralelo a visão que Paulo, o jornalista, tem da caça à baleia nos Açores e a sua relação e de Ana, a fotógrafa, com Tom e Sharon, os estrangeiros misteriosos com um pequeno barco chamado Nicole.

O ponto de vista da caça à baleia do ponto de vista do caçador é certamente interessante e diferente do normal, e Rui Zink consegue retratar os caçadores não como vilões, mas como homens a fazerem o que melhor sabem: caçar baleias. Esperar.

Ao longo da narrativa há momentos de um humor bastante particular, que apreciei. A escrita tem alguns vícios, como usar "olfactar" e "cônscio" e palavras menos comuns de uma forma que não me agradou por aí além, mas aceito que seja o estilo do homem e até nem estraga muito a leitura (para além de ser uma questão meramente subjectiva).

O conto consegue ser assim uma boa surpresa, que me deixa curioso para ler um livro do autor. Se conseguirem encontrar este livrinho, experimentem.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

The Final Empire (Mistborn #1)

Título: The Final Empire
Autor: Brandon Sanderson


Opinião: Depois de muito me azucrinarem a cabeça, lá comecei a ler a trilogia Mistborn. Terminado o primeiro livro, The Final Empire, admito que tinham razão: isto é fenomenal!

O mundo criado por Sanderson é bastante intrigante, e a forma fragmentada como ele o apresenta, deixando sempre mais um segredo escondido, está muito bem construída.

No mundo de Mistborn há nevoeiros ameaçadores, chuva quase constante de cinzas, "pessoas normais" e os skaa, trabalhadores/escravos de tal forma oprimidos, e durante tanto tempo, que não têm qualquer tipo de motivação. Uma raça inteira vencida, enfraquecida e rigorosamente controlada.

A governar este mundo está o Lord Ruler, uma criatura poderosa, imortal, o herói que salvou o mundo e o tirano que o controla com mão de ferro.

E por falar em ferro, já ouviram falar do sistema de magia que Sanderson criou? Chama-se Allomancy, e é honestamente badass. Os allomancers engolem metal e conseguem "queimá-lo" para terem certos poderes, como aumentar as capacidades físicas, melhorar os cinco sentidos, atrair ou empurrar metal, e outras coisas que tais, dependendo do metal que for usado. Este sistema de magia tem regras e um funcionamento bem definido, que Sanderson consegue explicar ao leitor de forma simples e sem soar a forçado, ao pôr Kelsier (uma personagem fantástica), um Mistborn, capaz de usar todos os metais possíveis, a ensinar Vin, uma Mistborn recém-descoberta, a usar os seus poderes.

A premissa da história em si é bastante simples: o Lord Ruler é um tirano, Kelsier é um tipo revoltado com o que sofreu, e com as desgraças pessoais que o atingiram, e decide revoltar-se e acabar com o longa ditadura que perdura no mundo. Reúne um bando de poderosos allomancers, todos mais ou menos fora da lei, e juntos põem um plano em marcha.

O truque está nas reviravoltas e nos conceitos que Sanderson inventa. O autor não só não tem medo de tirar o tapete debaixo dos pés do leitor, como ainda tem o descaramento de o enrolar no tapete e o atirar pelas escadas. E o pior é que o faz de forma dissimulada: corre tudo bem, não há assim nada muito imprevisível nem muito repentino, e de repente... BAM!

Já os conceitos, como se a Allomancy não fosse exemplo suficiente, há ainda os Inquisitors, homens com espigões metálicos enfiados nos olhos com as pontas a saírem na parte de trás das suas cabeças, que são demasiado poderosos para o bem de toda a gente. E podia continuar e mencionar os mistwraith, a Feruchemy, os kandra, e o plano secreto do Kelsier...

Ups. Eu disse plano secreto do Kelsier? Queria dizer... Hum... E os Terrisman, claro, os Terrisman.

Mas não pensem que só o Kelsier é que merece as honras da casa, apesar de ser uma personagem interessante, bem construída e extremamente carismática; há ainda que contar com a já mencionada Vin, com Ham, com Breeze, com Sazed (um Terrisman), com Dockson, com Marsh, com Lestibournes/Spook, com Clubs e até com Elend, o mais aborrecido deles todos (mas um leitor revolucionário! I feel you brother!).

Estão a ver de quantos nomes ainda me lembro? Se queriam mais provas de que as personagens são boas... Se mesmo assim isto não vos convence, aviso-vos que mesmo a escrita não sendo nenhum portento, é boa e terrivelmente viciante. O único defeito grande o suficiente para me fazer torcer o nariz é o ritmo da narrativa. A escrita vicia, a história também, mas vi as minhas expectativas a serem constantemente deitadas abaixo, em momentos em que tudo parecia indicar um grande desenvolvimento ou alguma brutal cena de acção, para depois ter mais um momento do grupo a conversar.

Não que não sejam momentos interessantes, mas isso frustrou-me um pouco, ainda que não me tenha impedido de viciar! E levou também a que o autor tenha passado centenas e centenas de páginas a desenvolver, para depois escrever um fim que achei algo abrupto e demasiado simples.

Tirando isso, fiquei bastante agradado que este Sanderson não se tenha revelado um Malazan, mas sim um livro muito bom por si só e como introdução para uma trilogia que promete e que ainda tem muita coisa para contar!

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Escrita e leitura


Acho que o que esta imagem diz é bastante óbvio. Trivial, como diria qualquer professor do IST. Um leitor pode ler toda a vida e nunca escrever mais do que o nome e listas de compras, que não se perde nada, mas um escritor tem obrigatoriamente que ter uma enorme bagagem de leituras.

É através da leitura que um escritor aprende muito do seu ofício. É a ler que um escritor arranja muita da sua inspiração. Só conhecendo muitos tipos de escrita e muitas formas de contar uma história, é que um escritor consegue criar algo interessante, cativante e realmente bom.

Já para não falar de que ler nos torna activamente mais inteligentes e cultos, o que é sempre uma vantagem.

Também é sabido que criticar o que se lê afecta a forma como se lê. Quando nos habituamos a olhar para um texto ou um livro de forma mais objectiva, para ultrapassar o simples "gosto/não gosto" e avaliar a qualidade de uma obra, acabamos por o fazer mesmo quando não queremos.

É inevitável notar que aquele autor usou um truque narrativo para prender o leitor, ou que escreveu aquilo assim para permitir o que vinha a seguir. Já dava conta disso por causa das opiniões que escrevia para o blog, mas desde que participo na Oficina de Escrita da Trëma que isso ainda é mais gritante.

Não é que essas coisas me passassem ao lado, mas agora dou por mim a ler a fazer pausas inconscientes na "leitura por prazer" e a pensar "se ele tivesse feito assim, tinha evitado esta explicação e isto lia-se melhor". Sem ser necessariamente aquela sensação de "eu fazia melhor" (já la vou), é ainda assim uma sensação difícil de afastar e de explicar.

Mas eu, sendo o tipo violentamente opinativo que sou, tenho uma opinião: eu acho que a escrita afecta a leitura. Imaginem que vão ver um espectáculo de magia depois de aprenderem a fazer os truques. Não é assim tão impressionante, pois não?

É claro que há maus mágicos, há mágicos medíocres, há mágicos excelentes, e toda uma série de categorias pelo meio, mas o efeito é sempre o mesmo. Eu já sei que aquela carta veio da manga, ou dum bolso dissimulado, e que ele a tirou de lá quando eu estava distraído a olhar para a outra mão dele. Posso apreciar a rapidez com que o faz ou insultar a fraca distracção, mas sei qual é o truque.

Imaginem truques mais complexos, e é isso que quem lê arrisca, quando começa a escrever. Eu cá não me considero um escritor, sou um tipo que escreve há muito tempo, mais por desafio próprio, e que já teve a sorte de ter um mini-conto publicado numa mini-antologia (nunca ninguém me vai calar), mas sinto um bocado isso.

Parecendo que não, eu já escrevo qualquer coisa desde a primária, da qual já saí há coisa de dez anos. Isto quer dizer que passei metade da minha vida com alguma coisa entre mãos a ser escrita. Pequenas histórias mal amanhadas em inúmeros bloquinhos, ou contos de dez mil palavras com reviravoltas atrás de reviravoltas, já tenho alguma experiência de escrita.

Bem, talvez "experiência de escrita" seja uma expressão demasiado forte. Chamemos-lhe "treino em juntar palavras". Pelo menos já consigo expressar ideias e contar histórias, com uma escrita que algumas pessoas acham boa o suficiente para a lerem. Não é mau.

Isto para dizer que sinto o que estava a mencionar ali em cima, especialmente desde que me juntei à Oficina e escrevo com mais regularidade e deixei de encarar o acto de escrever como um mero acto de inspiração e jeitinho para a coisa.

Por exemplo, acabei anteontem de ler o The Final Empire, do Brandon Sanderson, e não vi imediatamente a relação entre as duas personagens principais como sendo uma de pai e filha, como o autor tenta passar; aquilo que vi primeiro foi uma junção perfeita para explicar o mundo criado ao leitor. Uma personagem muito experiente que toma a personagem inexperiente como protegida. Não podia haver melhor forma de familiarizar o leitor com o mundo e o seu funcionamento.

Estão a perceber? É curioso. Eu pelo menos acho, desde que me apercebi. Nem sequer é algo tão óbvio quanto isso, mas sente-se claramente, e convido qualquer leitor a sentar-se e a escrever uma história. Qualquer coisa. Não prometo que sintam a diferença com três páginas de escrita, mas escrevam qualquer coisa e logo dão por ela.

A minha reacção quando me apercebi foi um rotundo "Quem diria?". E é uma sensação boa, confesso. Espero que consigam sentir o mesmo.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Eu, Wolverine

Título: Eu, Wolverine
Argumento: Chris Claremont
Arte: Frank Miller


Opinião: Raramente digo que não a ler qualquer coisa com o Wolverine. É dos meus super-heróis favoritos: para terem noção do quanto gosto dele, vi todos os filmes dos X-Men e ambos os Wolverine. Foi preciso um certo nível de devoção, garanto-vos...

Felizmente, no que a banda desenhada diz respeito, acho que é complicado um autor estragar uma personagem como esta. Eu sei que as más histórias (e as terríveis) dele devem andar por aí, mas até agora nunca me vi muito mal servido.

Este livro não foge à excepção, e eu nem sequer sabia que era a base para o filme mais recente, ou muito provavelmente teria adiado a sua leitura. Não o fiz e não fiquei desapontado.

O retrato de Wolverine enquanto um "samurai falhado" é fantástico. Faz sentido com representações anteriores da personagem, e é pareceu-me ser uma evolução natural na compreensão que o público tem da personagem. Pelo menos eu não estranhei.

As outras personagens já não me fascinaram tanto, mas este Wolverine com problemas, com dificuldades e a debater-se não só com o mundo e os vilões, mas consigo próprio, agradou-me. Não me deu propriamente uma visão nova da personagem, embora talvez o tenha feito aos leitores da altura, mas é impressionante a forma como Claremont e Miller conseguem fazer com que a personagem contraste tão fortemente com o cenário da história, o Japão, ao mesmo tempo que se integra na perfeição.

O equilíbrio é delicado, e só mostra o quão complexa é esta personagem, e o porquê de ser tão popular. Para além das gloriosas patilhas, obviamente.

Uma boa leitura, que aconselho não só a fãs da personagem, mas a toda a gente com o mínimo de interesse, ou até a quem tenha vontade de descobrir o mundo das BD's.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Amo-te para sempre


Título: Amo-te para sempre
Autor: Fernando Alvim

Opinião: Achei este conto um pouco disperso. Até nem está mal escrito, mas os constantes parênteses são apenas palermas. A sério, o conto ficava melhor sem eles, não fazem qualquer tipo de sentido, e aborreceram-me.

É uma técnica que até pode ter alguma piada, mas que quando usada em exagero apenas consegue interromper desnecessariamente a leitura e assim dificultar a vida ao leitor.

No entanto a história não está má: o protagonista está bem caracterizado (que tipo freakazóide do caraças) e o final é, na realidade, um bocado assustador. Aquilo está-se mesmo a ver para onde caminha, mas é perturbador de qualquer maneira.

Em suma, um conto que não me enche as medidas, mas que não achei mau de todo.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Murmúrios das Profundezas

Título: Murmúrios das Profundezas
Argumento: Rui Ramos, Flávio Gonçalves, Diogo Campos, Luís Belerique e Ricardo Reis
Arte: Rui Ramos, Vanessa Bettencourt, Diogo Carvalho, Luís Belerique e Phermad


Opinião: O ar lovecraftiano e o facto de ser de autores portugueses chamou-me a atenção. Confirmar que a inspiração é de facto lovecraftiana, e que o livro nasceu quase de uma brincadeira, prendeu-me.

Infelizmente o livro não sobrevive às expectativas. Murmúrios das Profundezas reúne seis pequenas histórias em formato BD, com artes distintas e o horror lovecraftiano em comum, mas não consegue estabelecer-se como bom.

Tem alguns erros, algo minimamente desculpável numa edição de autor, mas os argumentos em si não são grande espingarda, e os diálogos não são muito famosos, também. Mas os temas escolhidos são fantásticos, sempre invadidos por terrores e inspirações lovecraftianas, e conta com histórias passadas em Portugal, o que dá pontos de bónus ao livro.

O problema é mesmo o facto de serem histórias curtas. As histórias saem apressadas e confusas, e um bocadinho mais de desenvolvimento não lhes fazia mal nenhum. Acho mesmo que esse é o único problema em alguns dos contos, e que se tivessem o dobro das páginas eu teria de facto ficado a gostar.

Já foi bom pelo menos ver que existem autores portugueses com vontade e capacidade, tanto de criar como de arriscar. Este é assim um projecto que vejo com bons olhos, e ainda que a execução não tenha sido muito do meu agrado, não posso negar que o livro tem qualidade, mais que não seja a nível da arte, que mesmo não me tendo marcado especialmente, tem alguns bons momentos.

Apesar de tudo, um livro que vale a pena conhecer.

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Estantes Emprestadas [2]: Literatura Potteriana [2/2]


Depois de "alguma" divagação, a Júlia lá conseguiu chegar ao cerne da questão e começar a realmente debitar o que as personagens da saga do Harry Potter leriam. Quando lhe pedi que escrevesse isto, consegui ver logo as engrenagens (ou o tico e o teco, como ela diz) a funcionar furiosamente, e fiquei intrigado com o que iria sair daquela cabecinha.

Tendo lido isto tudo já há algum tempo (muahahahahah) fiquei logo satisfeito. Espero que tenham gostado da primeira parte e que gostem desta segunda. Se não, digam que sim, para ela não me bater, pode ser?

Hum, quer dizer, obrigado Jules!


Literatura interespécies? Intraespécies? Não sei...

Há, no entanto, um ponto que não sei bem resolver. Além de seres mágicos e fantásticos, temos mais seres inteligentes que não os humanos. Temos centauros, goblins, seres que terão direito a literatura própria, não? Faria sentido, não têm os mesmos gostos, não partilham a mesma cultura, até mesmo o contacto entre raças é “evitado”. Dentro de cada uma reside uma cultura literária. Um pouco como mundo muggle vs. Mundo mágico, apenas que eles partilham o mesmo mundo. Portanto sim, literaturas separadas parece-me muito razoável. 

Óbvio é que tem de haver uma boa margem para divagações no mundo muggle. Nós temos no mundo deles, porque não hão-de fazer o mesmo? Vejo é as histórias imaginadas no nosso mundo a serem patetas, livros cómicos com as coisas “estranhas” que nós fazemos (patinhos de borracha.. quem diabo é que pensa nisso..) ou então histórias muito negras, bizarras, sobre como conseguimos ser tão maquiavélicos, esquemas, traições e enganos. E não esquecer os guias de convivência e de “usos e costumes”: como lidar com mugles? Como falar com eles? O que fazem os mugles? Como vivem os mugles? Adorava ler um livro desses. Mas enfim, de certeza que há mais coisas mas para mim estas são os best sellers da secção.

Toda a imaginação e capacidades literárias inerentes à escrita de um bom livro (e mínima aceitação do mesmo, embora um não traga o outro) não são exclusivas deste mundo. Enredos, mistério, suspense, uma boa escrita, cativante e até bonita, nada disso é alterado por passarmos para lá das barreiras mágicas. E mais a mais a sensibilidade deles é diferente, têm outras vivências com com certeza alterarão a visão que têm do mundo, o que de certeza se reflectirá na escrita. 

Now, backwards...

Só por curiosidade, e já que me meti a pensar nestas coisas, também me veio à ideia o que leriam as personagens que nos foram apresentadas na saga no nosso mundo. Por estranho que pareça a resposta para praticamente todos foi imediata. Alguns surpreenderam-me bastante, e não tento sequer explicar de onde vêm estas ideias, simplesmente não faço ideia.

Muita BD para o Ron. BD do tipo deles ainda por cima, nem precisa de imaginar as coisas, já tem pequenos vídeos que fazem o trabalho por ele. Não o vejo a ser um leitor compulsivo. Mais um leitor de contos de terror, pequenas coisas que o deixam curioso mas que no fundo não queria ler; e BD. Essencialmente grande fã dos quadradinhos. Coisas que puxem menos ao “pensamento” e mais à parte visual (não lê um V for Vendetta ou um Watchmen). 

Um Dan Brown para o Harry. Uma leitura engraçada, um bocado a dar para o comercial, mas bem cotada. Acho que se enquadra no estilo, gosta de ler mas muito para mostrar, ler o que aparece em destaque nas livrarias como sendo uma boa leitura. À parte do fanatismo desportivo, claro, um livrinho da história do desporto de vez em quando.

Serviria um belo dum calhamaço para o Neville, tem ar de quem me apareceria à frente com um King de mil e tal páginas na mão. Para mim era um apreciador disfarçado de ficção científica, de suspense, um policial de vez em quando. 

É com uma boa parte de gabarolice que me comparo, a mim e aos meus parceiros literários, com a Hermione, e como tal o que imagino para ela é um pouco o que eu faço. Bons livros, vários autores, vários estilos e géneros, aprendendo novas coisas em cada um. Alargando sempre os horizontes literários e querendo conhecer cada vez mais. 

Já para a Ginny imagino-a uma verdadeira menina em termos literários, apaixonada por romances históricos, românticos, misteriosos, perigosos q.b. e com cenários que fazem sonhar. Pequenas incursões em géneros diferentes, para tentar variar um pouco, mas sempre com a praia dela em Jane Austen e afins. 

Agora, e acho que foi a ideia mais estranha que tive, mas a primeira de quem me lembrei
foi a Luna. E não faço a mais pálida ideia porquê, mas o autor que automaticamente me saltou à imaginação foi Balzac. Não faço ideia, mas a Luna é tão louca. Grandes dissertações filosóficas que ninguém consegue perceber de onde vieram devem ser a praia dela. Misteriosa como é de certeza que na mesinha de cabeceira teria livros de como cuidar de Nargles e bichos estranhos afins, ao lado da Fisiologia do Casamento. Ela tem o mundo dela, ninguém a pode perceber, e é genial muito por isso. 

Deixem-me sonhar...

Confesso que adoraria ir a uma biblioteca do mundo mágico. Nem vou falar das possíbilidades da própria biblioteca em si, vemos as bibliotecas monumentais que temos por cá, seja a magnífica Biblioteca do Convento de Mafra ou a tão afamada Livraria Lello, agora tudo isto com um tecto estilo Salão Nobre ou um sistema de categorias tipo Gringotts. Nem pensar é bom. 

Agora a biblioteca em si. Os livros. As categorias. As divisões por espécie. A imensidão das prateleiras. Nem sei. Havia potencial para algo demasiado grandioso sequer para o que a minha imaginação consegue assegurar.

Além de tudo isto havia sempre o bónus de podermos estar a folhear um livro qualquer, olharmos para o lado e temos um centauro calmamente a ler o jornal. Bem, para isso acontecer já o regime de centauros tinha de ter sido alterado e a sociedade mágica teria de estar um pouco diferente mas esqueçamos tudo isso e acreditemos nessa possibilidade de qualquer das formas.
Pode ser que sim... Um dia... 

Bottomline... ... ...

Isto custou a começar, mas pegando no computador foi ver aparecer as páginas! Depois de muita edição neste texto consegui juntar algumas das minhas ideias nesta matéria. Não sei bem se segui bem o tema, mas disseram-me para pensar nisto e escrever e bem, foi isto que saiu. 

Uma coisa é certa: mesmo que tenha divagado um pouco diverti-me imenso a escrever isto tudo. Harry Potter é uma saga que eu realmente gosto, num mundo que acho bem criado e que me consegue sempre prender a ele. 

No fundo fiquei, desde o início, bastante contente por poder fazer parte desta ideia genial do Rui e pelo próprio tema que me “calhou”. Dava-me asas para escrever sem restrições, num assunto que não teria pensado desta forma e que é perfeito para mim. Harry Potter e livros. Nem sei!

Além de tudo ainda me deixou ter uma perninha neste blog fixe que me dá sempre que ler e enche a minha lista de leituras próximas, não é verdade Sr. Rui? Enfim, adorei a experiência, perdoem-me o fanatismo casual e as ideias estranhas que possam ter aparecido eventualmente. Obrigada Rui... :)

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Division by Zero

Título: Division by Zero
Autor: Ted Chiang

Opinião: Muito interessante, este conto fala um pouco sobre o que aconteceria se a matemática não fizesse sentido. Se em vez de ser um sistema formal todo bonito e perfeitinho, fosse inconsistente.

O que o conto faz melhor é explicar conceitos complicados (e altamente abstractos), assim como lidar com a natureza intuitiva da matemática, bastante complicada de explicar, exactamente por ser intuitiva.

Ted Chiang usa o truque da personagem que não percebe grande coisa de matemática (o marido da protagonista), para que as coisas lhe tenham de ser explicadas e, consequentemente, ao leitor, mas não recorre a isso com demasiado facilitismo.

Não achei a escrita extraordinária, e não gostei do fim, nem do facto de se centrar tanto numa visão tão pessoal do assunto, mas gostei.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

A Ilha

Título: A Ilha
Autor: J. M. Coetzee
Tradutora: Marta Morgado


Opinião: Esta leitura não foi motivada por nada em particular. Um autor do qual nunca li nada, que ganhou o prémio Nobel (relativamente) recentemente; um livro pequeno, ideal para experimentar. Mais nada.

No fim não achei nada de especial. É uma reinvenção da história de naufrágio mais conhecida de sempre, a de Robinson Crusoe e do seu criado negro, Sexta-Feira. O autor acrescentou uma náufraga, Susan Barton, permitindo assim analisar e expandir a história de uma nova perspectiva.

Fiquei surpreendido quando conseguem sair da ilha antes de chegar a meio do livro. Mais surpreendido fiquei quando Susan começa a contar a história a Daniel Defoe, o autor da história de Crusoe. Vi potencial na premissa! Infelizmente, fiquei desapontado.

A ideia é interessante, e o livro está bem escrito, embora não seja um tipo de escrita que aprecie particularmente, mas o único propósito é filosofar, e como descobri da pior forma ao ler Gonçalo M. Tavares, isso é algo de que não consigo gostar, filosofia mascarada.

Coetzee ainda por cima fá-lo sobretudo através dos diálogos, mais frequentemente monólogos do que outra coisa, e o resultado é uma indiferenciação das personagens: têm todas nomes e aspectos diferentes, mas a voz com que falam é a mesma, a do autor.

O único propósito parece ser filosofar, e ao fazer isso através dos diálogos, mais frequentemente monólogos das personagens, Coetzee consegue apenas indiferenciar essas mesmas personagens, dando-lhes nomes e aspectos diferentes, mas vozes iguais: a sua.

Este objectivo está bem à vista, e pelo menos não se reveste de uma onda de nonsense estapafúrdio, mas não é o meu tipo de leitura. Assim não consigo gostar e lá tenho que passar o outro Coetzee que ali tenho mais para o fundo da lista...

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Hoje Não

Título: Hoje Não
Autor: José Luís Peixoto


Opinião: A minha história com este autor remonta a uns anos atrás e não tem nada a ver com a escrita dele.

José Luís Peixoto era júri de um concurso de mini-contos promovido pela Coca-Cola, ao qual participei. Aquilo tinha limite de palavras, e eu andei a cortar o meu texto para ficar dentro dos limites.

Não ganhei nada, mas isso não me chateou. Chateou-me ver textos escolhidos com quase o dobro do tamanho permitido. Desde aí, fiquei com um ódio quase incompreensível ao senhor, e muito provavelmente injusto. Mas fiquei.

Tanto que demorei 3 ou 4 anos a decidir-me a ler qualquer coisa sua. Comecei por este livro, que até me disseram que era porreiro. Agora antes de começar a crítica propriamente dita, digo já que li o livro sem preconceitos e sem "eu não gosto de ti, portanto o livro não vai prestar". Li e avaliei como faria a qualquer outro livro. É óbvio que para que eu gostasse mesmo, tinha que ser mais extraordinário do que um livro de outro autor, que não consigo evitar o sentimento de desconfiança, mas tentei ao máximo ser mais imparcial.

Com este aviso feito, sinto-me seguro para dizer que não gostei do livro. É formado por contos, alguns mais longos e dois ou três bem pequenos, mas praticamente todos banais e inconsequentes, pouco desenvolvidos, com personagens com pouca profundidade, e mais focados em serem profundos e simbólicos do que serem bons.

Começando logo por Legalize Airlines, que até tem uma ideia porreira (ponto a favor, o autor tem uma boa imaginação) em que uma rapariga herda um avião de passageiros e decide criar a sua própria companhia aérea juntamente com os amigos, mas que não parece ter propósito e é contado sem graça

Depois vem Biografia sem dentes, um dos contos mais parvos que já li na vida. Uma pessoa perde os dentes em várias situações importantes da sua vida. É tudo. Pequeno e passageiro.

Joana dos cabelos verdes, zero de relevância, não me interessei pela história, que tinha a premissa interessante de um autor que encontra entre freiras uma rapariga revolucionária que tinha conhecido há uns tempos. O autor aqui conseguiu pegar na história e torná-la honestamente desinteressante.

Quando cheguei a Eu e as poetisas, já estava farto de ler este livro. E agora aparecia-me um conto que metia poesia no título. Revirei os olhos, bufei, resmunguei para quem quisesse ouvir, respirei fundo e continuei a ler. Ainda foi dos contos em que a escrita mais me agradou, mas a história sobre uma poetisa que fala demasiado baixo para ser ouvida é tão... espera, eu disse história? Devo-me ter enganado.

Quase no fim há :-) e :-(, que tem um título curioso e que até me estava a interessar minimamente ao início, mas que rapidamente se tornou aborrecido. Um tipo diz ter inventado aquelas carinhas só para impressionar uma mulher (bastante peluda, go figure). Mas as situações artificiais e idiotas e as personagens de papel não me deixaram gostar.

Finalmente aparece o Fantasma escritor, o único traço de algo bom neste livro, uma viagem meta-literária que ainda consegui apreciar, em que o autor goza um pouco consigo próprio (talvez tenha sido por isso que gostei, eheh) e demonstra que a sua escrita consegue ser bastante superior ao que vi nos outros contos.

No fundo é um livro de contos aleatórios e inconsequentes, sem interesse e recheados de frases vazias. A escrita não é nada de extraordinário, a estrutura tem momentos pouco ortodoxos curiosos, mas pouco relevantes. Nota alta para a capacidade do escritor em se situar em vozes diferentes, conforme o narrador que usa, e para a sua imaginação e humor, que mesmo não tendo tido momentos brilhantes, promete.

Livro lido, continuo a não gostar do autor. Este livro não me convenceu de que é extraordinário e uma promessa da literatura portuguesa. Mas por outro lado também não me convenceu a desistir por completo. Talvez tenha mais sorte se ler um romance do autor, mais estruturado e cuidado.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Estantes Emprestadas [2]: Literatura Potteriana [1/2]


E cá estamos de volta a mais uma crónica convidada, desta vez escrita pela minha namorada, cujo nome eu vou agora dizer, e do qual vocês não se vão rir: Júlia Pinheiro. Eu sei, ela sabe, toda a gente sabe. Não, não é essa Júlia Pinheiro, e não, não são familiares, nem os pais são fãs da outra. Coincidência.

Passemos agora à crónica. Tal como o Jorge, que escreveu a do mês passado, a Júlia faz parte do Metáfora de Refúgio, mas ainda é mais louca. Como é óbvio. Eu não me dou com pessoas normais. E além de ser apaixonada por livros, Doctor Who e praticamente tudo o que existe, é uma perigosa Potterhead, com conhecimento enciclopédico sobre aquele universo, e um carinho bastante real relativamente às suas personagens.

Portanto, quando lhe pedi para escrever uma crónica, era óbvio que tinha que meter Harry Potter e companhia. Como o objectivo era que também fosse uma crónica interessante de escrever, sugeri que ela imaginasse o tipo de literatura que as personagens de Rowling leriam. O resultado está aqui e é muito curioso. Daqui a uma semana aparece o resto. Por agora, divirtam-se!

P.S.: mais uma vez fui eu a escolher as imagens, parece que além de não me dar com pessoas normais, só me dou com pessoas preguiçosas.


Para começar garanto desde já que me vou controlar, não fujo muito em divagações, nem me perco na minha própria imaginação. No entanto, não posso negar que esta ideia é genial e que estou bastante entusiasmada, o que puxa à imaginação, não só pelo tema, que sendo feito à minha medida, e por quem foi, não poderia falhar, mas também por poder fazer parte desta iniciativa. 

Mas bem, o desafio que me foi proposto foi exactamente pensar em como seria a Literatura no mundo da saga Harry Potter. Ou seja, nós já conhecemos uma boa parte deste mundo mas há imensos pormenores que não nos foram descritos. No fundo não ficámos a conhecer tudo o que havia a conhecer e uma das coisas foi exactamente isso. A maior parte do contacto com hábitos literários mágicos vem das investigações proibidas na zona restrita da biblioteca de Hogwarts, o estudo para as mais diversas disciplinas ou o fascínio por Quidditch do Harry. Mas é pouco. Praticamente nada. Então deixem-me dar um pouco asas à imaginação e divagar um pouco naquilo que sair desta cabeça.

Quase que não somos Muggles!

Já que vamos, não direi comparar, mas pelo menos, analisar par a par mundo mágico e muggle podemos ver um pouco daquilo que nos é comum, que não é tão pouco quanto isso. Durante toda a saga conseguimos encontrar semelhanças daquilo que se passa lá com o que vemos no nosso dia a dia.

O comportamento social que por lá encontramos, desde as brincadeiras de crianças, com o que quer que haja nas proximidades - ok, nós brincamos com carrinhos, eles com vassouras, mas a ideia é a mesma - passando pelas paixões assolapadas de adolescentes - nós esperamos mensagens, olhares, dates, elas são mais directas ao assunto e têm poções de amor, mas, mais uma vez, vai dar tudo ao mesmo! - e a acabar (e até dá um toque bonito à coisa) nas relações entre pessoas, que tão exploradas são ao longo de todos os livros - por vezes até demais - seja nas amizades, nos ódios, nos amores, tudo.
No fundo, se virmos a coisa por um prisma ligeiramente diferente do habitual, poderíamos classificarmo-nos todos dentro de várias raças: brancos, pretos, amarelos, azuis, católicos, ateus, satânicos, muçulmanos, loiros, morenos, ruivos, muggles, feiticeiros... Têm costumes diferentes, maneiras diferentes de fazer as coisas mas de resto não podíamos ser mais iguais. 

Não é por isso de admirar que nas ondas mais literárias as coisas não falhem por muito. Há distinções óbvias e que não poderiam nunca ser descuradas, a realidade deles é diferente da nossa em vários aspectos, mas a base é a mesma em ambos os mundos (e noutros, mas é melhor não entrar por aí).

Mas então e livros?

Exactamente! Mas então e livros? Depois deste paleio todo cheguemos ao ponto essencial: como é a literatura do mundo mágico?

Não nos é dado a conhecer muito desse mundo. Temos uma boa quantidade de livros de história, de magia, aquilo que nos é apresentado como os manuais de estudo de Hogwarts (ah, Lockhart, as dores de cabeça que me deste logo no segundo livro), e que acabamos por acompanhar com uma fervor redobrado, ou então isso sou só eu... Para além desses temos as divagações que Hermione nos mostra: a quantidade de referências que Hogwarts - Uma História (Mathilda Bagshot) tem ao longo dos livros chega a ser exasperante. Portanto, como são os hábitos literários no mundo mágico? Para lá da parede da Diagon Alley o que se lê?

Não temos dados oficiais, não é verdade? Num mundo imenso como é o descrito por J.K.Rowling há ainda muitos pontos por definir, no meio de tanta coisa nova que surge não podíamos saber tudo, tudo. Mais a mais o nosso contacto com este mundo é reduzido a uma pessoa e esta ultimamente tem chamamentos de cucos a atender. Outras conversas.

Poderíamos pensar numa simples inversão daquilo que temos por cá: nós fantasiamos com monstros, bruxas, seres estranhos e invisíveis, tanta coisa. Mas para todos os efeitos nós inventamos estas coisas enquanto eles sabem da nossa existência. Têm formação para conhecerem, minimamente, os nossos modos e culturas, embora continuemos a ser um mistério para eles. Pessoas que para montar uma tenda têm de realmente meter mãos à obra, que lavam a loiça com as mãos, e não o conseguem fazer enquanto varrem o chão ou estendem a roupa. Impossível. Magia Negra!

No fundo, se formos a pensar bem, a literatura não há-de ter grandes diferenças, de uma forma muito geral. 

Antes que me batam..

Sagas românticas género Twilight, só podem ser veneradas. Vemos que as feiticeiras adolescentes são exactamente como as muggle: loucas! (embora mais perigosas, nós não temos forma de arranjar poções de amor... podemos tentar a velha máxima de “um homem conquista-se pelo estômago” mas pouco mais). Aqui não há muito por onde escapar: há adolescentes histéricas? A Stephanie Meyer trata de por essas hormonas aos saltos então.

Podemos ver por “Os Contos de Beedle, o Bardo” que as histórias infantis mantêm a sua
essência educativa, de transmitir uma moral bonita aos meninos pequeninos para que cresçam melhores pessoas, mostrar-lhes que os caminhos fáceis nem sempre são os melhores, que devemos ser todos amigos, blá blá blá. Já todos lemos disto, sabemos bem qual é a base de todas estas histórias. Os princípios a incutir são os mesmos.

Livros de aventuras: como é que pode haver mundo sem isso? É assim que se dá asas à imaginação de uma criança para explorar e fazer coisas outside the box. Todas as crianças / adolescentes sonham com fazer coisas destemidas, viver aventuras, descobrir coisas. Isso é inerente à condição curiosa do ser humano. Por isso, mágicos ou não, livros de aventuras nunca poderão faltar (e eu agradeço). 

Na banda desenhada tenho um dilema: imagens sossegadas para eles não são muito divertidas, estão habituados a fotografias móveis, pequenos vídeos, digamos, e nas BDs não me parece que fosse muito diferente. Em vez das nossas Mafaldas e Tintins sossegados, víamo-los a viver as suas aventuras em pedacinhos de vídeo, gifs praticamente. Eu neste caso acho uma pena. Eu sou fã incorrigível de banda desenhada desde pequena e não gostaria de a ver alterada desta forma. Talvez esteja a ser um pouco purista a mais, mas não me tirem as minhas BDs. Elas são tão perfeitinhas como estão!

Agora, ponto importante: O Fantástico. Aqui sim podemos dar asas à imaginação (a mim pelo menos apetece-me). O mundo mágico é muito mais rico em criaturas do que o nosso. Aqui temos medo de baratas, lá têm medo de dragões. É ligeiramente diferente. Aqui as crianças metem dentes debaixo da almofada à espera que uma fada os troque por qualquer coisa mais útil, lá têm fadas a combinar com os cortinados, para decorar a sala. 

Temos uma imensa obra de fantástico mas como seria se o fantástico fosse, no fundo, real? É esse o mundo deles. Basicamente, nós hoje temos romances do estilo: uma família muito bonita onde de repente há uma tragédia qualquer, a família desmorona-se por uns tempos e no fim fica tudo bem. Chato? É tudo muito natural e aborrecido? Agora metam-lhe lobisomens (a sério)! Vampiros (a sério)! Dragões! Fénixes! “Ah e tal, ia muito bem uma moça montada no seu dragão para casa quando recebeu um bilhete, por meio do vampiro da família, a dizer que o namorado tinha acabado com ela. Chega a casa deita-se no seu quarto a chorar copiosamente, com o desgosto, enquanto a sua fénix pousa a seu lado e encosta a sua cabeça à da dona.” Não sei quando ao restante universo mas isto é super interessante. Tem um dragão. Um vampiro. Uma fénix. Tudo isto é possível, numa história completamente banal. Nem sei o que ainda faço neste mundo. Este outro é tão mais engraçado.

É claro que tem de haver alterações de escrita, de cenários, mas embora a diversidade possa ser maior em mundo mágico também a temos por cá. E uma boa parte do encanto da literatura é exactamente ver como as mesmas coisas podem ser vistas sob tantos ângulos, pensadas de tanta maneira. Aqui este ponto é levado a um ponto mais extremista, mas eu só vejo vantagens nisso.

(Continua)

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

The Almost Moon

Título: The Almost Moon
Autora: Alice Sebold


Opinião: Alice Sebold escreve bem. Não escreve extraordinariamente bem, mas escreve bem. Os seus livros são têm temas (horrivelmente) pesados e dolorosos, mas a sua escrita é leve e despreocupada. Mas confesso que desta vez fiquei um pouco perturbado.

Acreditem que depois de Lucky, um livro de memórias com descrições detalhadas de quando a própria autora foi violada, e de The Lovely Bones, em que um tipo viola, mata e desmembra a protagonista, que depois narra a história do seu céu pessoal, eu pensava que já nada me podia surpreender nesta autora.

É que quer dizer, olhem para as capas dos livros. São fofinhas e femininas e maricas. A autora tem um ar simpático e maternal. Pronto, tudo bem, escreveu um livro sobre a sua violação e consequências, precisava de tirar isso do sistema. Depois escreveu um sobre dramas familiares, com violação, morte e desmembramento. Vá, influências da sua experiência pessoal que resultaram num belo livro de ficção que toca em temas profundos e muito negros, sem se exceder. Já chega, não é? A partir daqui a autora dedicou-se a escrever dramas familiares em que a coisa mais horrível que acontece é alguém partir uma perna e ninguém ter canetas cor de rosa para lhe desenhar lacinhos e coraçõezinhos no gesso... certo?

Não. Apresento-vos a primeira frase deste livro:

"When all is said and done, killing my mother came easily."

Surpresa!

Com esta frase, eu sabia que estava errado. 11 palavras que me provaram que a autora ainda tem muito que contar. A melhor parte? Essa frase é a mais  do livro inteiro.

Sem querer entrar em demasiados detalhes, a protagonista, Helen Knightly, tem uma mãe idosa, demente e agorafóbica, e um percurso de vida muito lixado. Muito, muito lixado. Helen mata a mãe e entra numa espiral de depressão, insanidade fria, apatia, comiseração, desespero e tristeza, que parece nunca mais ter fim.

A forma como Sebold descreve essa espiral, infelizmente, não é a melhor. As 300 páginas do livro contam pouco mais de 24 horas da vida de Helen, desde que mata a mãe, e passam a maior parte do tempo perdidas em memórias e considerações inconsequentes normalmente despoletadas por acontecimentos completamente irrelevantes e banais.

O retrato dos problemas mentais? Praticamente perfeito. A caracterização das personagens? As relevantes, bastante boa, para o resto, mediano. A história? Interessante. A estrutura? Horrível. Imaginem o que é ter 2 páginas de história, e depois 5 de memórias. Durante todo o livro.

A tipa olha pela janela, vê a casa de um vizinho, e tem uma recordação de qualquer coisa completamente irrelevante que aconteceu há uma catrefada de anos. Sim, as relações entre as personagens, especialmente a complicadíssima relação entre Helen e a mãe, estão muito bem feitas, mas os constantes fluxos de recordações tornam o avanço quase insuportável. A partir de certa altura as memórias começam a ser mais coerentes e a fazerem, de certo modo, avançar a história, mas continua a ser um avanço doloroso.

Não, não quero voltar a ler uma descrição da louca da tua mãe, quando vou na página 200 e ainda só se passaram meia dúzia de horas desde que a mataste. Eu sei que ela era louca, e sei que tinham uma relação complicada, podemos simplesmente avançar?

No fundo, não desgostei. A crueza da situação é fantástica, e volto a frisar a clareza com que as perturbações mentais são descritas, assim como as suas consequências e efeitos nas pessoas que rodeiam alguém doente. Mas a estrutura narrativa não me convenceu minimamente.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Comix Record

Título: Comix Record

Argumento: Alessandro Sisti, Francesco Artibani, Tito Faraci, Enrico Faccini, Massimo Marconi, Marco Bosco
Ilustrações: Claudio Sciarrone, Corrado Mastantuono, Enrico Faccini, Massimo De Vita, Nicola Tosolini
Tradução: Isabel Canhoto, Marta Amaral

Opinião: Como qualquer cromo literário que se preze, tenho um fraquinho por edições de coleccionador, limitadas, especiais, de luxo, seja o que for. Esta Comix Record ainda por cima tinha uma premissa fantástica: reunir histórias que se destacaram de alguma forma.

Desde a mais pequena (uma história inteira impressa numa só página!!), à mais romântica, passando por uma sem diálogos e até por uma sem desenhos, esta pequena BD é uma delícia.

A primeira é exactamente a mais pequena de sempre, de tal forma que na altura da publicação original a revista foi vendida com uma lupa. A revista apresenta a versão original e depois uma versão em tamanho normal. Chama-se Mickeyzinhoinho, e é uma história engraçada, que brinca com paradoxos temporais e máquinas que encolhem coisas. Não é nada de extraordinário, mas tem um valor histórico curioso.

Depois vem Mickey e o rio do tempo. A princípio fiquei duvidoso, porque pensei que fosse uma modernização da história antiga mais conhecida do Mickey, mas não, é uma homenagem/sequela bastante bem feita e que me agradou. Foi porreiro ver o Bafo e o Mickey a trabalhar juntos, e os camponeses ricos por causa do peixe que engoliu o diamente (twist! ah!), e o final com os dois a partilharem aperitivos, foi bonito.

Dois passos no parque, centrada no Peninha (e na sua aselhice), tem o Tio Patinhas, o Donald e os três sobrinhos a gozarem com o desgraçado numa história sem uma única fala. Apenas imagens. Bem executada, mas esperava muito mais, talvez uma qualquer razão para não haver falas (além do "bora fazer humor mudo", o que não é completamente mau).

Huguinho, Zezinho e Luisinho, e o tempo das maçãs, nada má, a história toda amorosa e o catano... A princípio torci o nariz (pelas mesmas razões do ilustrador, aparentemente), mas depois até gostei, confesso.

Por fim vem Patos às apalpadelas, que por um lado foi a decepção do livro. Uma história de BD sem desenhos, só falas, por causa de um apagão na Caixa Forte, quando lá se estava a festejar o primeiro negócio do ano para o Tio Patinhas. Gostei, e a coisa está bem feita, mas tem demasiadas personagens e fica confuso.

De destacar ainda a pequena introdução história que antecede cada história e que é sempre um bom complemento a este tipo de coisas. Um livro agradável, que podia ter sido bem melhor, mas que não pecou muito, e que é sem dúvida obrigatório para coleccionadores!

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Mal por Mal


Título: Mal por Mal

Autor: F. Scott Fitzgerald
Tradutora: Telma Costa

Opinião: Livro pequeno, praticamente um conto. Não fiquei fã. Até agora tenho gostado do que tenho lido deste autor, mas este achei bastante mediano.

Os temas são os habituais: o glamour e a decadência de um certo estilo de vida americana. Fachadas e hipocrisias, amores e desamores, etc.

Mas desta vez não estava a pegar. Quase até ao fim o livro pareceu-me apenas uma descrição de pessoas vazias, sem qualquer propósito. Nem as pessoas nem a descrição.

A história de um encenador de teatro arrogante, e da sua amada com sonhos de ser bailarina não me estava a convencer. Mas há um momento perto do fim em que tudo muda e permite pôr tudo o que aconteceu em perspectiva. E o final é bom!

Percebo que a ideia talvez até tenha sido esta desde o início: uma história seca e aborrecida, com um acontecimento perto do fim que muda tudo. A perspectiva altera-se e as conclusões tiram-se de forma quase imediata. Mas acho que o autor não executou muito bem, e embora o contraste funcione, não funciona tão bem como poderia. Uma pena.

sábado, 1 de fevereiro de 2014

Solidariedade


Aviso já que a única coisa que esta crónica tem a ver com livros é o facto de mencionar um escritor. Mas é um assunto em que fiquei a pensar. Caso ainda não tenham percebido o que é aconselho-vos a ler o título da crónica. Já está? Óptimo.

Confesso também que tenho uma opinião... complicada, relativamente à solidariedade. Logo para começar sou um adepto fervoroso do ensinar a pescar em vez de fornecer peixe, e do curar a doença em vez de tratar os doentes.

Esta última soou mal. Vocês compreendem. Não quero deixar ninguém morrer, mas acho os esforços são melhor aplicados a curar a doença do que a curar os doentes. Não sei bem como é que explico isto sem soar como uma pessoa horrível.

Deixem-me pôr as coisas nestes termos, que talvez seja mais fácil: existem muito provavelmente centenas de organizações de solidariedade cujo objectivo é recolher dinheiro para se construírem casas num qualquer país obscuro da África profunda. Eu acho que bastava haver meia dúzia com o objectivo de recolher dinheiro e voluntários para criar escolas e para ensinar os habitantes desse país obscuro a efectivamente viver melhor, seja através de práticas de higiene que previnam doenças ou de como cultivar melhor as batatas, para terem mais. Não percebo nada disso.

Isto está complicado. Não pensem que sou má pessoa, apenas não me estou a conseguir exprimir como deve ser. Fiquemo-nos pelo ensinar a pescar em vez de fornecer peixe, pode ser?

Com esta conversa, que está a correr mal para o meu lado, quero chegar a Patrick Rothfuss, autor de O Nome do Vento, do qual gostei muito, e O Medo do Homem Sábio, que ainda tenho de ler, mas estou à espera que saia o último livro da trilogia.

O homem tem um blog, engraçadíssimo e muito porreiro, onde fala frequentemente dos seus afazeres diários enquanto escritor e pai, e das peripécias com que se depara. Além disso, fala bastante da sua organização de solidariedade, a Worldbuilders, que faz um trabalho tremendo, em grande parte graças à divulgação do autor e ao carinho que os fãs têm por ele.

E pela sua mighty beard.
Pois bem, no outro dia um desses fãs perguntou-lhe exactamente o porquê de ele se esforçar tanto para a caridade, ou seja, porque raio é que estava sempre a falar disso e a divulgar tanto aquilo. A pergunta é feita da forma menos maliciosa possível, e com genuína curiosidade, e vale a pena ver a resposta do autor.

O desgraçado do homem acertou em cheio. Nunca tinha visto as coisas desta perspectiva, por um lado por falta de atenção ao assunto, por outro por pura arrogância e egoísmo de quem acha que curar os males do mundo é tarefa fácil, se as pessoas se dedicarem a isso. A verdade é que não é, e é importante passar essa mensagem. E o Rothfuss é tão bom nisto que me convenceu a pensar como ele.

Ainda duvido do trabalho da maior parte das organizações e acções de solidariedade, e prefiro curar a doença a curar os doentes,

(Já agora, acabei de me lembrar de uma boa forma de explicar isto: eu estou no curso de Engenharia Biomédica porque no fundo tenho ideais de Miss Universo, aquela história de ajudar as pessoas e não sei quê; podia ter ido para Medicina, mas acho que têm um trabalho inglório. Sem querer denegrir o trabalho dos médicos (só um bocadinho), são soldados nas trincheiras, a ganhar batalhas, um paciente de cada vez. E eu quero ser um estratega e ganhar guerras. Curar a doença em vez de curar doentes, estão a ver?)

mas percebo que a minha forma de pensar é demasiado radical e francamente idiota. Sei que estão convencidos da segunda parte, é sempre fácil achar isso das minhas ideias e opiniões, mas espero que estejam também convencidos da primeira. Ajudem.