quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Divertida-Mente (2015)




Os filmes para putos costumam ser interessantes. Às vezes nem sequer se pode dizer que sejam propriamente para putos. Este Divertida-Mente (Inside Out, no original) é um caso especial, de um tipo que tem andando, abençoadamente, muito em voga. É um filme que vai agradar bastante aos miúdos, mas que é capaz de ser mais apreciado pelos graúdos.

Não é estranho que os temas abordados num filme infantil sejam pesados, e que as piadas que aparecem sejam, digamos, ocasionalmente mais adultas do que seria de esperar em algo direccionado a crianças, mas são poucos os filmes que o fazem de forma tão explícita. A parte dos temas, não das piadas, tenham calma.

A própria premissa diz logo tudo: vamos entrar dentro da cabeça de uma criança/adolescente, e perceber como é que a sua mente funciona a partir de um complicado esforço de trabalho de equipa entre cinco emoções primárias, que ganham vida e se tornam nas personagens principais da história: Medo, Tristeza, Alegria, Repulsa e Raiva.

Todos os cinco são devidamente coloridos tendo em conta a emoção que representam, e agem como tal: Medo está sempre aterrorizado de alguma coisa, Tristeza fica demasiado triste para se mexer, Alegria é uma coisinha irritante e saltitona, de tão feliz, Repulsa é uma tipa perpetuamente enojada, e Raiva é a personagem mais razoável de sempre um tipo baixinho e vermelho que se irrita com facilidade.

Juntos respondem ao que acontece a Riley, a criança/adolescente a quem pertence a cabeça que habitam. Estão encarregues de coordenar as suas acções e de pôr as memórias, bolinhas coloridas de acordo com a emoção dominante, no sítio.

Incrivelmente simples, enquanto explicação para como é que nós funcionamos. Futuras gerações de pais podem poupar-se a muito trabalho e simplesmente pôr os miúdos a ver este filme.

E como se isto não bastasse, a transição de Riley de criança para adolescente, que acompanha a mudança de casa da sua família, é posta em perspectiva quando a Tristeza ameaça dominar e contaminar todas as memórias de Riley, não de propósito, mas apenas porque as saudades e a sensação de abandono tomam conta da criança. O que por sua vez leva a uma viagem interessante pela mente de Riley, incluindo passagens pelo pensamento abstracto, os bancos de memórias, o mundo da imaginação e tantas outras coisas, com a companhia do surpreendente Bing-Bong, o antigo amigo imaginário de Riley.

Há vários momentos comoventes, a pobre da Tristeza deixa de ser desprezada e passa a ser reconhecida como uma parte igualmente importante da mente de Riley, a Alegria torna-se (ligeiramente) mais suportável, Bing-Bong tem um percurso digno, tudo acaba bem, e a aceitação de memórias bicolores é uma excelente metáfora para a maturidade de já se ser capaz de ver para além do branco e preto (ou, neste caso, roxo e azul e amarelo e verde e vermelho).

Mas todo filme é uma grande viagem pela mente de uma criança a tornar-se adolescente, e praticamente nada falha. É como eu disse: muitos pais vão ter menos trabalho se se limitarem a mostrar este filme aos filhos. As explicações podem ser superficiais, por vezes, mas são mais do que suficientes para que as crianças percebam o que se passa. E isso é fenomenal.

O elenco português também esteve bem, e as únicas falhas que realmente aponto ao filme são apenas duas: o facto das memórias passarem da primeira pessoa, do ponto de vista da Riley, para a terceira pessoa, o que não faz muito sentido; e o desprezo que se acaba por dar às três emoções que apesar de protagonistas, são secundárias, o Medo, a Repulsa e a Raiva. Eu sei que estas cinco divisões já são simplificações, e que há uma mensagem a enviar, mas não é realista a visão que o filme dá.

Tirando isso, nada a apontar, tirando as picuinhices. Divertida-Mente é um bom filme, sem sombra de dúvida!

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