sábado, 30 de janeiro de 2016

Uma Nova Era (Marvel Salvat #3)


Argumento: John Ney Rieber
Arte: John Cassaday
Tradução: Paulo Moreira


Opinião: Capitão América. Outra vez. Parece espantoso que com todos os problemas que tenho com a personagem, me cheguem às mãos tantos livros dele. Aparentemente, é um dos favoritos por esse mundo fora, provavelmente por causa do enorme favoritismo que tem nos EUA, quase exclusivamente derivado do seu valor patriótico.

Esse ausência de valor enquanto personagem sempre me chateou. Para além de ser um símbolo e uma personagem basicamente perfeita, há ali pouco sumo, digamos assim. Só que tem sorte, pois com tanta visibilidade acaba por ter uma quantidade de histórias e de equipas criativas enorme, o que significa que só com muito azar e/ou incompetência é que não se arranjavam algumas coisas decentes!

Felizmente este livro consegue ser um desses casos felizes. Calma, continua a não ser nada de extraordinário, mas tendo em conta que é um livro do Capitão América... Estou impressionado.

Ah, e melhor ainda. Este podia muito perfeitamente ser o pior livro do Capitão América de sempre, já que começa com a personagem a lidar com as consequências do atentado de 11 de Setembro de 2001. Sim, a personagem mais patriótica de sempre num dos momentos mais emocionais de sempre da nação que representa. Sabem que cheiro é este? É patriotismo. Este livro exala disso.

Mas John Ney Rieber, o argumentista, consegue fugir, em grande parte, a essa faceta, e escreve uma história que serve de homenagem às vítimas e mensagem de esperança para toda a gente. Não é uma história perfeita, longe disso, mas mostra o Capitão América a ser uma pessoa real, como apenas raramente acontece. E só por isso, até vale a pena espreitar.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Orlando - O caracol apaixonado


Texto: Sérgio Mendes
Arte: Elias Gato


Opinião: Não sou a pessoa mais imparcial para falar deste livro. Os desenhos foram feitos por um amigo, o grande Elias Gato, um tipo versátil e com talento para dar e vender, tanto no desenho, como na escrita.

O desgraçado tenta, e tenta e tenta, e raramente desiste. A sua capacidade acaba por ganhar, e acaba a ganhar prémios milionários (sim, tu és rico, paga-me lá o jantar) e a ver o seu trabalho publicado e à venda por todo o país. É merecido, sem sombra de dúvida, e era preciso terem estado no lançamento lisboeta para ouvirem o discurso dele e perceberem o quão importante isto é para ele.

Eu compreendo-o. É ver o trabalho recompensado. Poderá haver algo melhor para alguém? Especialmente para alguém que se dedica a um meio e a uma actividade com relativa pouca expressividade nacional? Melhor que isto, agora, só publicar mais!

Pela minha parte, li o livro, e tenho coisas a dizer. A começar pelo texto e pela história, ambos para lá de fracos. O autor, o Sérgio Mendes, que me desculpe, até é quase meu conterrâneo (é de Guimarães) e pareceu-me uma pessoa simpática e agradável, mas a história tem falhas imperdoáveis. E a quantidade de texto por página? Terrível!

Essa parte, imagino, não será inteiramente culpa do autor, mas também da editora, só que... Pronto, é uma quantidade ridícula.

Depois há o caracol que usa o Facebook para conhecer a namorada, e que tanto é surdo que nem uma porta como ouve perfeitamente pessoas do outro lado da janela a darem instruções sobre a internet, e temos ainda a velhinha que se transforma numa osga, depois de ver que alguém lhe entrou em casa e lhe deixou um recado no computador que a faz ir atrás dessa pessoa até ao Algarve, sem fazer a mínima ideia de quem tenha sido.

Enfim, há coisas muito estranhas a acontecer na história, e se o livro se torna minimamente agradável é graças aos desenhos do Elias, que são muito bons e bastante adequados e apelativos para crianças. Só tenho dois pequenos problemas, dos quais já falei com ele: os narizes das personagens dele são sempre... peculiares; o caracol tem os olhos no sítio errado.

Tirando isso, Orlando - O caracol apaixonado acaba por ser um livro que vale a pena comprar. E mesmo que não valesse, eu ia-vos dizer a mesma coisa, que o Elias merece que o trabalho dele seja visto e tenha divulgação. Parabéns Elias!

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Wolverine: Origem #2



Argumento: Kieron Gillen
Arte: Adam Kubert
Tradução: Paulo Moreira


Opinião: Não é péssimo... mas anda lá perto. Já estava de pé atrás, graças ao primeiro volume, mas ainda tinha alguma esperança. O principal problema tinha sido um Wolverine completamento desprovido dos traços característicos da personagem. Aqui já não era suposto existir esse problema, portanto havia a possibilidade de as coisas correrem bem.

Mas pelo menos em termos de história. não correu. As personagens até são interessantes, assim como a luta de Logan com o seu eu bestial não tão interior quanto isso, mas o enredo é demasiado óbvio e a introdução dos Creed é feita a martelo e força o engano dos olhos dos leitores, de forma tão óbvia que dói (embora já me tenham dito que isso é só problema de eu já conhecer relativamente o Wolverine enquanto personagem).

Enfim. Safa-se a arte, que é verdadeiramente espectacular, principalmente nos momentos iniciais, quando ainda temos um Logan/Wolverine selvagem, a viver com lobos e a matar ursos. Mas de resto, digamos que não me fica na memória...

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Matar é Fácil


Autora: Agatha Christie
Tradutor: Carlos Afonso Lobo


Opinião: Livro interessante, embora sem Poirot nem Miss Marple. Prefiro, de longe, as histórias que envolvam essas personagens, mas tenho confiança suficiente nesta autora para ler o que quer que seja que tenha o nome dela por baixo.

O investigador principal desta história é que deixa um pouco a deixar. Luke Fitzwilliam, reformado, parece-me apenas relativamente competente, mais interessado em enamorar-se da rapariga de quem está a fingir ser primo (pormenores) do que outra coisa. De resto, todas as pessoas da localidade onde os crimes acontecem são super estranhas e potenciais assassinos, o que é peculiar. Normalmente Agatha Christie consegue fazer cair suspeitas sobre praticamente todas as personagens existentes, mas não me lembro de lhe ler uma história com tantas personagens esquisitóides.

Desde um vendedor de antiguidades que se mete em rituais de magia negra, a um militar reformado que gosta mais dos seus três cães do que de outra coisa coisa/pessoa qualquer, passando por toda uma série de personagens inacreditavelmente, e citando a malta da Rádio Comercial, chalupas!

O principal suspeito, tão suspeito que até convence o investigadorzeco, é uma pessoa execrável, tão cheia de si mesma que dói. E depois, plot twist... Digamos que é óbvio, o que acontece.

Essa reviravolta topou-se um bocadinho antes do fim, é certo, mas a coisa até está bem construída. Só tenho pena que o amor entre Bridget e Luke seja tão forte e tão repentino, e que não haja um verdadeiro seguimento do resto das personagens, todas elas estranhas, mas interessante. Estão em foco enquanto são suspeitos, ou enquanto é preciso fazer-lhes perguntas, mas depois desaparecem de cena e nunca mais voltam nem se sabe nada deles.

No fim fica uma história que entretém, com uma resolução satisfatória, mas que tem pouco de história de detectives. A personagem principal, que está a investigar o caso, não descobre lá muita coisa. Limita-se a andar ao sabor das descobertas que vão sendo feitas de uma forma geral, e nem sequer faz nada de particularmente relevante, para além de roubar uma noiva e de chamar as autoridades a sério, quando o caso se complica.

Mas Agatha Christie é sempre agradável de ler, e nesse ponto o livro não fica muito atrás do que seria de esperar.

sábado, 23 de janeiro de 2016

Porquê Ciências?

"Para perceber como funcionam as coisas!"

Maricas. Essa é a resposta bonita que se dá para a malta não nos achar esquisitos. A realidade é que "fazer ciência" está para "perceber como funcionam as coisas" da mesma forma que "correr a maratona" está para "cortar a meta": até pode ser o objectivo final, mas ninguém tem o título de cortador de metas; são corredores.

Portanto deixem-se disso. É uma visão redutora, e que embora não negue completamente, também não apoio activamente. Até porque existem mais campos do conhecimento que permitem perceber o funcionamento de alguma coisa. Psicologias e afins para perceber o ser humano, Economias e afins para perceber o sistema criminal, por exemplo.

Mas quando alguém se mete nisto, rapidamente percebe que "perceber como funcionam as coisas" é só mesmo um chavão para explicar rapidamente o que andamos a fazer. Um investigador pode passar a vida inteira a estudar uma única bactéria, ou proteína, ou animal, ou processo metabólico, ou o que for, e morrer sem nunca perceber como é que funciona.

Não é perceber que interessa, é aprender. Aquele investigador que esteve cinquenta ou sessenta anos a olhar para a mesma coisa de vários ângulos diferentes pode nunca cortar a meta, mas a sua contribuição para a Ciência pode ser digna de Nobel. Novas técnicas, descobertas secundárias, e até eliminação de hipóteses. A próxima pessoa a pegar no mesmo objecto de estudo pode olhar para trás e dizer "bem, não é assim que funciona" ou "olha, não vai ser assim que vou descobrir".

Sim, a Ciência deve ser o único campo em que um tiro ao lado pode ser tão (ou mais) importante do que um tiro certeiro.

Claro que interessa ter objectivos, metas a cortar, e é preciso tentar atingi-las o melhor possível... Todos temos algum objectivo, em todos os trabalhos em que pegarmos,

(a não ser que ainda estejamos a tirar o curso, aí é só trabalho inútil)

e só ficamos mesmo mesmo satisfeitos se o atingirmos. Mas também é legítimo que, não conseguindo, se aprenda bastante, e isso é importante por si só! Pelo menos para mim é, ou não tivesse sido isso a convencer-me. Sim, descobrir coisas, ajudar pessoas, isso tudo... Mas sabem do que é que eu sempre gostei, desde que era uma criatura minorca de olhos esbugalhados? De aprender. E ainda é disso que gosto hoje, e só isso é que me permite manter o mínimo de sanidade mental!

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

The Faust Act (The Wicked + The Divine #1)



Argumento: Kieron Gillen
Arte: Jamie McKelvie, Matt Wilson, Clayton Cowles


Opinião: É fácil esquecermo-nos que existem editoras americanas de BD para lá da Marvel e da DC. Quais colossos açambarcadores, ficam com tudo, inundam o meio de publicidade, e torna-se complicado divulgar outras coisas, por muita qualidade que tenham.

E no entanto é exactamente duma terceira editora (que tem um tamanho considerável, tendo em conta o sufoco da BD por aqueles lados), a Image, que surgem alguns dos títulos que mais me atraem. De Saga a Tony Chu, passando por Fatale e Walking Dead, bem como alguns dos títulos que mais curiosidade me despertam, como The Mice Templar, The Manhattan Projects, Spawn e mais uns poucos.

De tal forma que basta o selo de qualidade desta editora para eu dar uma hipótese. Este livro não foi excepção e, pouco depois de me vir parar às mãos, devorei-o, como se deve fazer com BD. Fiquei impressionado, mas tenho algumas coisa a apontar.

Para começar a arte é boa. Faz lembrar Saga, embora vários degraus abaixo (todos a fazer vénias à Fiona Staples, se faz favor), e a história é certamente interessante e conta com personagens fascinantes, mas falta qualquer coisa. A premissa é, sem ponta de dúvida, o tipo de coisa bizarra que gosto de ler: a cada noventa anos há doze deuses (de um enorme panteão) que surgem no mundo, no corpo de adolescentes, e que graças aos seus poderes rapidamente se tornam autênticas celebridades. A contra partida é que morrem após dois anos.

Fixe? Fixe. Depois claro que há intrigas e porrada entre deuses, para isto ser interessante, e o ritmo é completamente alucinante... Mas no meio de tanta coisa é fácil perder o rumo da leitura. As coisas acontecem em catadupa, e há sempre tanta coisa diferente a acontecer que é mesmo difícil de acompanhar. Fica a sensação de que mesmo com atenção, não se apanha tudo, e que apanhar tudo é essencial para apreciar verdadeiramente o livro.

Mas fiquei impressionado o suficiente para que esse pormenor não me assuste. Vou sem dúvida acompanhar!

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Era uma vez uma faculdade

Que ainda acha normal exigir trabalhos entregues em papel, e só avisar na véspera, e porque alguém perguntou. Até Sexta.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

O Dragão de Sua Majestade (Téméraire #1)


Autora: Naomi Novik
Tradutor: Afonso Arouca


Opinião: Um excelente livro, do qual gostei muito mais do que aquilo que estava a contar. O meu conhecimento deste livro resumia-se basicamente à premissa: "guerras napoleónicas, mas com dragões". Digamos que não é preciso muito mais para me cativar, ou a qualquer pessoa com o mínimo de juízo.

As críticas que fui descobrindo eram boas, e tive a sorte de apanhar os livros em promoções que me permitiram comprar os três já publicados em Portugal, por uma autêntica ninharia. Ficaram arrumados na estante, como muitos outros, simplesmente à espera da melhor altura para serem lidos.

Como tal, as minhas expectativas não eram nada de especial. Não sabia mesmo o que esperar. Podia ser um enorme flop, algo espectacular, qualquer coisa ali pelo meio... Podia focar-se nos dragões e passar-se num universo demasiado alternativo, ou podia ser um romance histórico fiel, com algumas aparições de dragões aqui e ali.

Nada me preparou para a realidade. Não é uma obra-prima, mas é um bom livro. Os dragões são interessantes, a história é cativante, o enredo não é nada pesado e não se esforça demasiado para contar uma grande demanda. É simplesmente uma introdução quase perfeita ao universo em questão, mas que tem relevância como livro independente, e que simplesmente funciona bem.

Seguimos as desventuras de Will Laurence, um destemido oficial da Marinha britânica, empenhado em trucidar tudo o que lhe apareça à frente com um sotaque francês. A vida corre-lhe bem até ao momento em que captura um ovo de dragão num navio francês, prestes a eclodir, e sem tempo de chegarem a terra e de o entregarem a alguém competente. Conclusão: alguém vai ter de sacrificar o seu papel na Marinha para que o dragão em causa seja domesticado e se torne numa mais valia para a Inglaterra.

Acho que já estão a adivinhar que o desgraçado que se torna aviador é o próprio Laurence, que tem assim de abandonar a capitania do seu navio para treinar e combater ao lado de Téméraire, o nome que dá ao dragão.

Em termos de história, digamos, relevante, é isto. O cerne do enredo é isto, e a partir daqui torna-se tudo bastante linear e "simples": acompanhamos o treino, algumas batalhas, alguns problemas de um homem da Marinha se ir infiltrar na Força Aérea, algumas descobertas relativamente ao comportamento dos dragões e do Téméraire em particular, que se revela como um raro dragão chinês, etc. etc. etc...

As personagens são interessantes e a awkwardness britânica formal funciona bem. O mais espantoso é a forma como a autora consegue disparar em várias direcções, ao contar uma história de dragões, de história alternativa, com crítica aos estratos sociais (nobreza, povo, Marinha, Força Área), ao papel das mulheres e tudo aquilo em que conseguiu deitar a mão.

Felizmente as batalhas estão bem descritas, embora merecessem mais uns toques. Cada dragão tem uma personalidade própria e interessante (palmas para Téméraire, como é óbvio, mas também para Levitas, o desgraçado do dragão do desprezível Rankin), e tudo converge para um final agradável, que vira algumas expectativas do avesso e deixa muita coisa em aberto passível de ser explorado em livros futuros, mas sem nunca deixar nada demasiado pendurado.

Fico à espera de ler mais, sem dúvida, e já não devo demorar muito a pegar no segundo!

sábado, 16 de janeiro de 2016

A Louca do Sacré-Coeur (Novela Gráfica #2)


Argumento: Alejandro Jodorowsky
Arte: Moebius
Tradução: José de Freitas e Pedro Cleto


Opinião: Quando um livro não nos agrada, não há muito a fazer. Por mais expectativas e desculpas que tentemos arranjar, a coisa não pega. Foi o que me aconteceu com este livro, que até tinha tudo para ser porreiro: os autores prometem, especialmente com Moebius a tratar da arte.

Infelizmente achei o livro péssimo. Péssimo, a sério. Nem arte nem aquilo que passa por enredo se safa. Nada, nadinha faz sentido. A história de um professor de Filosofia que começa a encontrar um propósito para a sua vida miserável não convence. A sexualidade exagerada também não. O humor escatológico (aprendi esta com o David Soares, é o meu momento culto do dia) muito menos.

Já para não falar do ritmo desregrado, das aventuras delirantes sem qualquer nexo, e da quantidade enorme de coisas que tentam ser simbólicas e ter significados profundos… Mas que falham miseravelmente.

A sério, não tenho nada agradável a dizer sobre o livro. Nem sequer me conseguiu entreter. Os diálogos são banais, quando não são fracos, as várias histórias - parte de uma narrativa maior - são idiotas, as personagens são coerentes mas igualmente idiotas, e tudo acontece ao calhas.

Este, senhoras e senhores, é um mau livro.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

O mundo já é um sítio dividido o suficiente

Guerras e guerrinhas. O meu pais é melhor que o teu. Preciso mais desse petróleo do que tu. Sou mais branco que tu, portanto sou mais fixe. Isso de não seres heterossexual faz de ti menos fixe. Como sou homem, tens que fazer o que eu digo, ouviste mulher?

Um sítio fantástico, este mundo em que vivemos, não é? Até as notícias que valem a pena se perdem no meio de tanta inutilidade e futilidade. Avanços na Ciência, importantes conquistas políticas, valentes feitos humanitários, extraordinárias vitórias sociais, livros que se publicam, filmes que se lançam, música que vai e vem.

Nada interessa, porque algures nos Estados Unidos da América um grupo armado tomou conta de um edifício federal. E porque em quase todas as indústrias, os homens são mais bem pagos do que as mulheres. E porque isto e porque aquilo e acoloutro e sei lá mais o quê. As grandes notícias e os grandes acontecimentos são estas coisas, pessoas de dois (ou mais) lados de uma muralha, física ou ideológica, a chamarem nomes uns aos outros, ou outra coisa parecida.

Enquanto isso, acontecem muitas coisas boas, excepcionais até, mas que mal são notícia. Vivemos num mundo tão dividido que é impossível prestar a devida atenção às coisas boas, quando existem tantas coisas más para resolver. É injusto e desagradável, mas é assim que as coisas são.

E o pior de tudo? Livros e séries divididos ao meio. O que foi, achavam que ia falar de coisas sérias? É que até vou. Isto de dividir as coisas que leio e que vejo ao meio tem muito que se lhe diga.

Primeiro, e isto é óbvio nos livros, existem argumentos bastante racionais relativamente aos livros grandes que são traduzidos. Podemos espernear o que quisermos, mas livro de mil e tal páginas não são objectos fáceis de produzir a um preço razoável. O mercado em língua inglesa consegue aguentar esses mastodontes graças a um público exponencialmente maior e a uma tradição de publicação muito diferente da nossa, em que não há tanto apreço pelo objecto, e portanto aparecem mais edições em formatos mais pequenos, ou com papel de qualidade mais duvidosa, mas ainda mais do que suficiente.

Mas é irritante que para ler algo que posso comprar em inglês por nem dez euros, às vezes tenha de desembolsar mais de trinta para ter a versão completa em português. E digo isto falando como pessoa que gosta muito do livro-objecto… Apenas sou picuinhas em termos de edição com os livros mais espectaculares e especiais. A maior parte das obras podia vir impressa em papel de jornal ou em papiro antigo (o que era brutal, caso alguma editora esteja a ler), que eu não queria saber.

Já as séries são mais difíceis de compreender. Compreende-se que saltem semanas com alguma coisa importante, ou que façam uma pausa durante a altura do Natal e Ano Novo, por exemplo, mas existem muitas séries que fazem uma pausa no final de um ano e que depois só recomeçam praticamente a meio do ano seguinte.

É uma das coisas mais irritantes em que consigo pensar. E nem sequer consigo encontrar argumentos que o justifiquem. Talvez aquela conversa de os espectadores não ficarem tanto tempo à espera de novos episódios? Tretas.

Imaginem que vos começo a contar a uma história. Vocês interessam-se, querem saber mais, provavelmente até estou a caminhar a passos largos para algum tipo de cliffhanger. Agora imaginem que quando lá chego…

Bem, daqui a três meses conto-vos. Não faz sentido, pois não? Sinto-me sempre irritado. Uma coisa é esperar por um livro, ou por mais uma temporada, mas ambas as coisas são feitas de forma a serem relativamente independentes. Têm que ter valor sozinhas, e não só como parte de um todo, algo que não costuma acontecer se forem divididas ao meio. Portanto vão-se todos lixar, pessoas que decidem dividir livros e séries e tudo o que não devesse estar dividido!

Precisava de deitar isto cá para fora. Já estou melhor.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

The Arrival


Autor: Shaun Tan


Opinião: Não desgostei. Mas dizer que gostei é demasiado forte. A arte é espectacular, magnífica mesmo, sem a menor dúvida... Mas tirando isso, não houve muito para convencer.

No que toca a BD's até sou um tipo relativamente fácil de satisfazer: a arte tremenda e o Universo peculiar, cheio de pormenores fantásticos, são dois factores que já me deixam mais do que meio encaminhado para ficar fã.

Mas a este em particular, faltou-lhe a história. Ou melhor, faltou-lhe uma forma de me fazer perceber melhor a história. Porque a história está lá, e eu até a percebo, em traços gerais, e dou-lhe mérito. Todo o sofrimento relacionado com a imigração, não exactamente a que se dá hoje em dia, que é demasiado fácil - no sentido em que não significa assim tanto estar longe da família, por exemplo - mas a imigração que se dava há umas décadas atrás, quando era preciso largar mesmo tudo na esperança de conseguir algo melhor, partindo do nada, só por se estar num país diferente.

E como a maior parte dos imigrantes, os do livro, e o protagonista em particular, são pessoas esforçadas e trabalhadoras, que muito suam e pouco se queixam, na esperança de conseguirem ajudar a família, que está longe, e com sorte talvez até a consigam para perto.

Essa parte, especialmente do ponto de vista emocional, está perfeita. Só que o livro não tem narração, nem diálogos, nem nada. É só imagens. E embora isso até costume encaixar bem aqui nas minhas engrenagens, e com artes piores e menos expressivas, desta vez simplesmente ficou aquém.

Quando terminei fiquei a pensar "mas que raio se passou?". Não fiquei com nada em concreto. Apenas algumas imagens geniais e as ideias gerais que atravessam a história de uma ponta à outra. Talvez se possa usar o argumento de que esse é um bocado o objectivo, pois o protagonista não é um emigrante qualquer, mas representa todos os imigrantes, e não discordo completamente disso.

Só que não funciona. Ou não funcionou inteiramente para mim. E nem sequer vos consigo explicar exactamente porquê. Acreditem que fiquei tão fascinado como qualquer pessoa com algumas das imagens que aparecem neste livro, mas a história em si passou-me ao lado, de uma forma geral. O que é estranho, porque uma arte com esta qualidade costuma dar-me ainda mais vontade de acompanhar a história, quer ela venha explicitamente escrita ou não, só que neste caso eu olhava, olhava, olhava e, de certa forma, não via nada. Consegui acompanhar, de forma grosseira, e ficar com as tais ideias gerais, fáceis e óbvias de apanhar, mas foi só.

Fico com pena, porque acho que o livro é realmente bom, e até o aconselho vivamente a toda e qualquer pessoa, porque até dá gosto só de olhar para ele... mas pronto.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Bones [T01]



Com o aparecimento do CSI, deu-se início a uma revolução. Os inevitáveis spin-offs, cópias e outras séries com o mesmo estilo policial-mas-nos-bastidores não demoraram a surgir. Algumas tornaram-se coisas verdadeiramente interessantes e com qualidade (NCIS e Criminal Minds, que eu conheça e me lembre assim de repente), e outras nem por isso.

No entanto acho que nenhuma teve uma premissa tão arrojada como Bones: um agente do FBI junta-se a uma antropóloga forense e à sua equipa, para juntos resolverem os mais variados crimes. E mais ainda, pois se CSI sempre foi muito focada nos crimes em si, NCIS sempre quis mais ver as personagens a interagirem, e Criminal Minds usa os crimes violentos para explorar a condição humana, Bones preocupa-se muito mais com as emoções e o desenvolvimento das personagens principais do que com tudo isso.

Basta olhar para o duo de protagonistas: Booth, o agente do FBI, é o coração do programa desde logo, uma personagem emotiva com quem é fácil de simpatizar; Brennan, a antropóloga forense, por outro lado, é fria, distante e com uma personalidade muito mais racional.

O contraste não podia ser maior. É claro que para a série funcionar, ambas as personagens partilham o peso emotivo, e ambos os actores fazem um óptimo trabalho, especialmente David Boreanaz, que parece que nasceu para o papel de Booth. Brennan é, na realidade, tão emotiva como Booth, apenas lida com isso de forma diferente. Se Booth vive com o coração nas mãos, Brennan tem-o enterrado bem lá no fundo.

Infelizmente, sendo esta a primeira temporada, ainda teve vários episódios mais fracos e menos confiantes, como se os argumentistas ainda não tivessem a certeza do que fazer com estas personagens. Ainda por cima todas ganham muito claramente uma vida própria nas mãos dos actores, que são completamente irrepreensíveis e encarnam cada personagem com uma naturalidade impressionante.

Isto significa que a temporada é bem porreira: foi lentamente criando aquilo que é mais interessante na série, as histórias mais gerais e mais envolventes, quer em termos de personagens quer em termos de pura abrangência daquilo que estamos a ver. Sim, Bones é maioritariamente uma série de crime-por-episódio, mas brilha realmente quando aproveita esses pequenos mistérios para desenvolver as personagens e as histórias transversais a todas elas.

Nada melhor do que mostrar que estas personagens são reais. Têm problemas que os afectam directamente. Mistérios próprios, quer sejam a família rica de Hodgins, a família numerosa e religiosa de Zack, o mais ou menos namorado de Angela (assim como as suas inclinações lésbicas), a vida amorosa de Brennan e os seus pais misteriosos, ou aquilo que Booth passou na guerra.

O último episódio é o catalisador perfeito, com a descoberta dos ossos da mãe de Brennan e uma chamada final do seu pai, a avisá-la para não o procurarem. Bom, muito bom! É pena que para isto tenha sido preciso sofrer uma série de episódios deploráveis e aborrecidos com que a temporada de vez em quando se lembrava de nos brindar, mas pelo menos fiquei interessado em continuar, o que é muito bom sinal!


sábado, 9 de janeiro de 2016

Anya's Ghost


Autora: Vera Brosgol


Opinião: Ficam já a saber que por mim não tinha pegado neste. Não só não parece ser o meu tipo de leitura, como nunca tinha ouvido falar deste livro. Felizmente a minha cara-metade tem entre os dons dela uma capacidade quase sobrenatural de descobrir livros peculiares e, invariavelmente, interessantes.

É o caso deste. "Lê, é giro.", diz ela. E lá vou eu. Nem sempre funciona às mil maravilhas (daqui a uns dias já descobrem um falhanço), mas costuma dar bom resultado... Assim foi. Anya's Ghost nunca na vida estaria no meu radar, mas após a leitura tenho pena disso. Se quase perdi isto, o que mais ando a perder? Não bastavam já aqueles que conheço, ainda tenho que desesperar por aqueles que não conheço?!

"Calma Rui, estás a ser parcial por ter sido a tua namorada a mostrar-te isto. Parece ser só uma história de fantasmas para adolescentes e ainda por cima com um traço infantil."

Vamos ignorar o Sr. Burro da Silva. Claramente não sabe o que diz. O traço é estilizado, sim, mas agradável e cartoony o suficiente para a fantasma parecer tão real e credível como qualquer outra personagem, e isso é um ponto de bónus, pelas minhas contas.

A história de fantasmas é tudo menos tradicional, e apesar dos protagonistas serem adolescentes, os temas abordados dificilmente o serão. O início é calmo e interessante, sofre uma fantástica viragem de rumo, e consegue terminar da melhor forma possível.

Estamos a falar de uma adolescente, Anya, uma miúda de uma família russa, e que só quer ser parte dos fixes e ter o namorado ideal. É uma rapariga esperta, mas uma aluna medíocre, e com tendência para se meter em problemas na escola e em casa. Até ao dia em que encontra uma fantasma, também ela uma miúda, morta há vários anos e esquecida no fundo de um poço. A amizade improvável tem resultados positivos... Até ao momento em que deixa de ter.

No final ficam a faltar algumas pontas por atar que mereciam ter sido abordadas, como a relação de Anya com as pessoas da sua escola (especialmente aquele miúdo meio esquisito), ou o ritmo bipartido entre os dilemas pessoais de Anya e o mistério que é a rapariga fantasma. De resto, impecável.

O resultado é um livro agradável, que se lê com gosto, e que embora merecesse algumas diferenças em certas abordagens (o sentimento de inadequação de Anya fica quase completamente por explorar), não se lê pior por isso.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

The Light Fantastic (Discworld #2)


Autor: Terry Pratchett


Opinião: Incrível. Terry Pratchett era um deus na terra. Este livro tem um humor excepcional e é uma sequela mais do que decente a The Colour of Magic. Acontece tanta coisa, e existem tantos pormenores envolvidos, que acho que nem consigo falar de todos.

Desde Cohen, the Barbarian, o maior herói de todos os tempos, velho e desdentado mas ainda capaz de efectuar o belo do kick ass, aos druidas que criam computadores de pedra.

O humor de Pratchett é fenomenal. Cada pormenor está lá por duas razões: construir uma boa história e criar uma bela duma piada. Escolham o vosso tipo de humor favorito, que ele está representado nestes livros. Este volume em particular, ao concluir a história começada no primeiro livro, apenas demonstra como a leitura vale a pena.

As personagens, essas, não só são credíveis (dentro dos limites do livro), como são extraordinárias. Rincewind é fenomenal, parece um tipo do Cinema Sins, sarcástico, extremamente crítico, e aparentemente a única pessoa com consciência do que se passa e de como o que se passa é absolutamente ridículo. Twoflower, o turista, é qualquer coisa de especial, em toda a sua obliviousness: sempre confiante de que tudo vai acabar bem, parece não ter medo de nada nem de nenhuma situação. Quando confrontado com coisas extraordinárias, mesmo que essas coisas sejam algum tipo de monstro assassino, a sua reacção é "quanto custa? quer fazer um seguro?".

Muito do humor nasce exactamente da interacção destas duas personagens entre si e com o mundo em redor. Quase diametralmente opostos, as suas reacções aos acontecimentos são complementares no pior dos sentidos possíveis!

E como se isto não chegasse, este livro ainda introduz personagens cativantes por si, como o já mencionado Cohen, the Barbarian, com oitenta e sete anos e que é, de longe, a criatura mais mortífera que aparece. Ou então os trolls, que são basicamente pedras com dentes de diamante que ficam imóveis durante o dia, mas também durante a velhice, quando começam a sofrer de filosofia e passam longos períodos sem se mexerem enquanto contemplam questões existenciais.

Ainda nem falei das árvores que falam e conversam com Rincewind enquanto este lhes responde e nega, racionalmente, que as árvores estejam a falar com ele. Então e a Luggage, uma arca de madeira mágica com montes de perninhas e uma lealdade impressionante a Twoflower, o seu dono. De aspecto discreto, esta mala ambulante consegue ser uma das personagens mais poderosas, quer em termos de carisma quer em termos literais: regras mágicas intrínsecas ao próprio funcionamento do mundo parecem não lhe dizer nada. Se é para ir para tal sítio, e supostamente é impossível ela lá chegar, ela aparece na mesma.

No fim acontecem algumas mudanças ao Universo de Discworld, a nível macro (palmas para a mãmã A'Tuin!) e micro, que parecem ser o ponto de partida. Pelo que sei, e pelo que percebo da descrição do resto dos livros, a partir de agora Pratchett toma um papel mais satírico e explicitamente crítico. E torna-se ainda mais brilhante. Por exemplo, o próximo volume, sobre uma rapariga que é acidentalmente imbuída com poderes mágicos reservados normalmente a homens, chama-se Equal Rites. Ah!

Tudo em Pratchett é fenomenal. Vou continuar a acompanhar a série como já praticamente só acontece com algumas BD's. Estava a precisar disto, um autor ainda mais crítico que eu. Já vocês, por favor, atrevam-se a descobrir!

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

The Abominable Bride




Detectives carismáticos são uma das minhas fraquezas narrativas. Atirem-me um Sherlock Holmes ou um Hercule Poirot, uma Miss Marple ou outra personagem qualquer do mesmo género, e convencem-me. Até pode ser um Dr. House, manifestação médica da criação de Conan Doyle.

Portanto também não é de espantar que as adaptações ao pequeno e grande ecrã não me passem ao lado. As histórias de Poirot, interpretado pelo excepcional e super adequado David Suchet (a personagem parece ter sido criada à sua imagem), prendem-me sempre, mesmo que apenas por alguns minutos antes de sair de casa.

Por outro lado, e como Sherlock e Poirot em particular me acompanham desde que me lembro, enfureço-me com facilidade quando alguém decide abusar da sorte e fazer algo ridículo em seu nome. É o caso dos filmes com o Robert Downey Jr. e Jude Law nos papéis principais, que são apenas filmes de acção passados em Londres e centrados num detectiva, e não filmes do Sherlock Holmes, assim como é o caso da série Elementary, que embora pareça ter mais respeito pelo trabalho original, me faz mais do que um pouco de comichão

Felizmente existem pessoas como Steven Moffat e Mark Gatiss, meus conhecidos de Doctor Who. Quando Sherlock apareceu, estranhei. Tratava-se de uma modernização, o que me soa sempre estranho. Mas vindo de quem vinha, não havia de ser demasiado mau. Decidi experimentar.

Abençoado o dia.

Devorei o que havia disponível como se não houvesse amanhã. Depois desesperei por as temporadas serem só de três episódios (ainda que de hora e meia cada) e o intervale entre elas ser de pelo menos dois anos. Convenci a minha namorada a ver, deixei-a igualmente viciada, e pelo menos passei a ter alguém com quem desesperar.

Há dias vimos o semi-especial de Natal The Abominable Bride, que furou todas as minhas expectativas, depois triturou-as, atirou-as ao chão e dançou a polka em cima delas. Da melhor maneira possível.

O episódio há muito que andava a ser anunciado como uma aventurada Vitoriana, numa realidade alternativa, para que o programa tivesse oportunidade de ter uma adaptação fiel das histórias de Conan Doyle sem que isso interferisse com a série.

E quando começou, parecia ser exactamente isso. Um recontar da história que já conhecemos, com momentos de outros episódios vistos através de uma lente vitoriana, com direito a um Sherlock ainda mais irritante, por algum motivo.

Só que havia qualquer coisa estranha. Esses momentos decalcados de episódios anteriores podiam ser só peculiaridades do argumento, graças a dois argumentistas que gostam mesmo daquilo que fazem, ou podiam ser algo mais. Para mim houve um momento ainda relativamente perto do início que me deixou com a proverbial pulga atrás da orelha.

Com o avançar do episódio, iam aparecendo mais pistas que comprovavam a minha teoria, e como consequência ia aumentando a minha admiração pelo episódio, os actores, os argumentistas, o programa em si e tudo e todos os que com ele estão relacionados.

Afinal, e agora é o momento ideal para as pessoas que não gostam de spoilers começarem a fugir o mais depressa possível deste blog, tudo aquilo estava a acontecer na mente de Sherlock, refugiado no seu palácio mental, com a ajudinha de um cocktail de droga dos agressivos. O objectivo era explorar um caso centenário na esperança de perceber como é que Moriarty podia estar de regresso!

Genial! Tudo funciona de uma forma estupenda, desde o sempre excepcional Martin Freeman, que não se deixa ficar na sombra de um tremendo Cumberbatch, até à forma como as histórias interagem, mais dignas de um episódio de Doctor Who (ah!) do que de Sherlock.

Por falar nisso, não posso deixar de notar numa coisa. A longa história vitoriana a que assistimos não demora mais do que dez minutos em tempo real, como se o tempo dentro da cabeça de Sherlock andasse mais devagar do que na realidade - bem, para isto fazer sentido o tempo anda mais depressa dentro da cabeça dele, para que vários dias correspondam apenas a dez minutos, mas pronto, vocês percebem. O que interessa é que o Sherlock usa este truque para ganhar tempo.

Sabem onde é que isso também aconteceu recentemente? Em Heaven Sent, o penúltimo episódio da mais recente temporada de Doctor Who. Sim, Sherlock já tinha usado o conceito em quase todos os episódios, mas nunca, que me lembre, como uma forma de ganhar tempo.

Enfim, excepcional a vários níveis, e termina com um cheirinho para a próxima temporada. A beleza da construção do episódio é que foi um pedaço de entretenimento de qualidade, não revelou quase nada de concreto para a próxima temporada, mas não foi apenas uma versão alternativa dos acontecimentos. Foi interessante, mais do que cativante, e relevante. Até contou com o regresso de um extraordinário Andrew Scott como Moriarty-alucinação.

Um excelente episódio, que já vi dividir ligeiramente as opiniões entre os fãs. Eu cá fiquei fascinando, este é o tipo de televisão inteligente e bem feita que gosto de ver. Experimentem também, acreditem que vale bem a pena!

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

A quântica dos transportes

No outro dia tive uma revelação. Como utilizador frequente dos transportes de Lisboa, passo muito tempo enfiado dentro duma carruagem do Metro ou dum autocarro da Carris. Isto significa que lido todos os dias com os problemas típicos: atrasos nos transportes, falta de lugar, viagens empacotadas, gente mal educada, enfim, toda uma panóplia de coisas agradáveis.

O mais irritante talvez seja aquela incapacidade que as pessoas têm em esperar. Vocês sabem, quando o metro pára e está uma multidão a querer entrar, e ao mesmo tempo uma multidão a querer sair. Aqueles momentos em hora de ponta quando todos os transportes parecem latas de sardinha com rodas, e quando parecem existir mais pessoas em Lisboa do que ruas a subir.

É nessas alturas que o meu eu mais primitivo vem ao de cima, e me apetece desatar à pancada a tudo o que me aparece à frente. Confesso sem grandes problemas que não hesito em forçar a minha saída e a empurrar quem estiver à frente, e até descobri que isso tem uma vantagem que não fazia ideia: as pessoas que empurro já me ensinaram uma quantidade imensa de impropérios novos.

Mas juntamente com a minha raiva contra estas pessoas, fiquei sempre a pensar em algo mais. Afinal, como é que é possível que as pessoas, tão funcionais quanto eu, não consigam perceber que é mais fácil desviarem-se e esperarem que os passageiros saiam do que tentarem forçar a entrada? As carruagens do metro têm limites físicos, impossíveis de contornar. Se uma já estiver cheia, não cabe lá mais ninguém, e se alguém quer entrar, é preciso que alguém saia.

Isto sempre me pareceu tão óbvio que nunca consegui perceber qual era o problema das pessoas. Custa assim tanto esperar uns segundos e depois entrar? Aparentemente sim, mas as razões escapam-me completamente!

Ou melhor, escapavam! Finalmente percebi o que se passava, e o problema é meu e dos outros maganos que pensam da mesma forma que eu. Pobres idiotas, fomos demasiado arrogantes para perceber o que realmente se passa. Falo por mim, como é óbvio, mas acho que em nome de todos os que pensam como eu, quando digo que se não fosse tão teimoso e convencido, já tinha este problema resolvido!

Tudo se resume a uma questão de física quântica. Aquilo que eu aprendi é profundamente idiota, e vocês preparem-se para verem a vossa vida virada do avesso. Sabem aquelas pessoas que forçam a entrada contra tudo e todos, sem esperar um nanossegundo que seja pela saída das pessoas? Sempre lhes chamei uns burros de… do… hum… do piorio, mas afinal são génios sublimados na mecânica profunda e intricada do mundo quântico: eles sabem que é possível dois átomos ocuparem o mesmo espaço ao mesmo tempo.

Ou seja, eles resolveram as equações certas e descobriram que é mesmo possível que dois corpos estejam a ocupar o mesmo sítio ao mesmo tempo, algo que consideramos impensável, nós que somos palermas confiantes nesses especialistas em Física que andam por aí nas Faculdades e no CERN e sei lá. Estas pessoas impacientes compreendem que em vez de esperarem podem simplesmente forçar a passagem e ficarem sobrepostos a quem está a sair, sem que isso impeça a dita saída.

Nunca me senti tão burro. Abençoadas sejais vós, oh grandes sumidades da quântica transportacional, e perdoai-me os meus pecados. Nunca mais me vou preocupar nem esforçar por me desviar nem empurrar quem quer que seja, vou simplesmente sair. Afinal, isso não incomoda ninguém, não é?

sábado, 2 de janeiro de 2016

Enfarda Brutos (Tony Chu - Detective Canibal #3)


Argumento: John Layman
Arte: Rob Guillory
Tradução: Filipe Faria


Opinião: Há coisas na vida que valem a pena. Entre as minhas favoritas estão aquelas coisas tão parvas que se tornam geniais. Como certos filmes de série B que já nascem praticamente como paródias de si próprios, mas que se revelam autênticos rasgos de génio.

Tony Chu não é bem assim, mas anda lá perto. O espírito é exactamente o mesmo que o desses filmes de série B: nem sequer há a mínima preocupação com fazer sentido, as coisas são assim e pronto, e é tudo tão absurdo e exagerado que dói.

No entanto tudo acontece de forma tão convicente e segura, que é impossível não levar a sério. Não tenho dúvidas que se vos explicar minimamente a história - que inclui canibais psíquicos, um implacável galo assassino, fruta alienígena que sabe a frango, híbridos de rãs e frangos, um polícia com meia cara cibernética e muito, muito mais - a primeira coisa que vocês vão dizer é “isso é ridículo, estúpido e não faz qualquer sentido”.

E sabem que mais? Não vão estar errados. Nenhum dos elementos individuais desta saga faz o mais pequeno sentido. Quando se começam a juntar, as coisas começam a ficar ridículas muito depressa. Eu próprio, ao ler a sinopse, pensei “que estupidez”.

O que acontece é que o conjunto, neste caso, é realmente maior do que a soma das partes. Eu não sei bem como, mas John Layman consegue criar um argumento coeso e consistente, com um enredo cativante e um ritmo fantástico. De tal forma que pela terceira vez acabo um livro da saga e tenho vontade de simplesmente virar a página e descobrir o que acontece.

A arte do cliffhanger está quase perdida, mas este tipo domina-a na perfeição. Ainda para mais apoiado na arte de Rob Guillory, entre o cartoon e o realista, com liberdade para expressar muito bem todas as emoções e pensamentos das personagens ao mesmo tempo que mostra momentos verdadeiramente tocantes e/ou sangrentos de forma credível.

Uma das melhores coisas nos desenhos é que são de extremos, ora extremamente limpos e relativamente vazios, com poucas fontes de distracção, ou estão populados de tantos detalhes e pormenores, muitas vezes em segundo plano, que é preciso fazer uma pausa na leitura para absorver tudo.

As revelações feitas neste volume em particular são difíceis de digerir - perceberam, perceberam? - especialmente a final, que ainda por cima é acompanhada de um momento emocional muito forte, ainda que discreto, e que muito me agradou. E mais uma vez, como já disse, fica quase tudo em aberto até ao próximo volume, que vou esperar com alguma ansiedade. Era tão fácil simplesmente perguntar ao Tio Google o que raio se vai passar…

Mas tenho de ser forte. São poucos os Universos ficcionais que merecem este tipo de auto-controlo da minha parte, por isso se querem uma atestado de qualidade, aqui o têm!

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Sobre essa coisa do Ano Novo

Olhem para o vosso calendário. Agora olhem outra vez para aqui. E agora para o vosso calendário. E agora para aqui. Repararam no que é que aconteceu?

Fizeram figuras parvas. Ah! Desculpem, eu prometo que aumentar a densidade de humor parvo aqui no blog não é uma das minhas resoluções de ano novo. Até porque eu não faço dessas coisas. Resoluções são para os exercícios e os testes. O dia de hoje não é particularmente diferente do de ontem nem do de amanhã.

Eu bem sei que as pessoas, criaturas de hábitos como são, precisam de momentos especiais para orientarem as suas vidas. Sem algo diferente, ainda que ligeiramente e auto-imposto, tudo é igual, tudo se mantém, e isso sem sempre é o que é preciso. Sem mudança, não há evolução. As resoluções de ano novo não passam disso mesmo: um momento de mudança forçada, já que somos demasiado preguiçosos para que essa mudança aconteça de forma natural e gradual.

Lá estou eu a ser amargo, dirá quem me conhece. Lá estou eu a ser arrogante, dirá toda a gente. Não acho que estejam errados, mas… *encolhe os ombros*

Isto até agora não foi mais do que um prelúdio para aquilo que quero realmente dizer: não faço resoluções de ano novo, pelo menos não directamente, mas não tenho problemas em aproveitar o momento para forçar algumas coisas. Só que no meu caso, por mais hipócrita que seja, não são resoluções, é OCD.

Bla bla bla, compreendam, a sério. Há alguma coisa melhor do que aproveitar o fim de um ano e o início de outro para realmente dar início a alguma coisa? É… limpinho.

Como tal, e caso ainda não tenham reparado, bem vindos ao novo QAENCEC, agora mais azul, mais livre, que mantém o seu Twitter e acrescenta uma página de Facebook! Até criei um logo (amador, claro, mas as minhas capacidades artísticas são deveras limitadas) e tudo! Talvez tenha abusado no azul, mas pronto.

Ah, e por “mais livre”, quero dizer, obviamente, que não vou impôr restrições: eu tenho tantas opiniões sobre tantas coisas, mais vale não falar só de livros, filmes e séries. Portanto vou falar daquilo que me apetecer. A maior parte será livros, muito provavelmente, mas são ossos do ofício.

Vou continuar a publicar às Segundas, Quartas, Sextas e Sábados, pelo menos por enquanto, mas sou capaz de mudar para Terças, Quintas e Sábados, conforme correrem as coisas. Também ainda vão haver algumas alterações por aqui, mas vai ser gradual. Quando tiver um tempinho, faço qualquer coisita.

E pronto, era só isto. Que este ano vos corra bem e tudo isso.